Desporto

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

E depois de Eusébio?

Julgo que foi António Costa que disse ter sido o fim de um ciclo. Referia-se ao ciclo colonial de Portugal, um ciclo que marcou cinco séculos da nossa história e que se refletiu no futebol nacional a partir do final da 2ª guerra mundial, onde, sobretudo no Sporting e no Benfica brilharam vários atletas provenientes das províncias ultramarinas de Angola e Moçambique; Peyroteu, Hilário, Coluna, Santana, Costa Pereira, José Águas, Eusébio, Nelson, Néné, Jordão, etc. Na verdade,  alguns destes extraordinários atletas, felizmente, continuam entre nós, o que nos leva a indagar da razão pela qual alguns vêm no desaparecimento do Pantera Negra o fim de um ciclo. Logo nos ocorre dever-se tal sorte ao prestígio e popularidade impares alcançado pelo Rei em virtude das suas extraordinárias façanhas desportivas. Porém, há algo de mais profundo, relacionado com o pavor que algumas forças políticas  têm perante o fracasso do regime que ajudaram a promover e que as sustenta. Fracasso que leve as pessoas a indagar da fiabilidade da doutrina sociopolítica dominante e a procurar conhecer melhor o regime anterior, em especial a primavera marcelista. Pavor de que as pessoas descubram, por fim, que, afinal, as coisas não são bem como lhes tem sido dito. E é por isso que tais forças têm desenvolvido especial atenção ao desmembramento dos elementos conservadores, como sejam os relacionados com a tradição, a igreja, o mundo rural e a família. E o Benfica e Eusébio; os últimos grandes símbolos do Portugal imperial, multirracial e multicultural. Esses, sentir-se-ão, finalmente, aliviados, apesar das lágrimas de crocodilo. Ao referir o fim de um ciclo, saltou-lhes o pé para o chinelo, visto que, tal apreciação não tem a menor relevância face à perda.
 
Um vazio emergiu após o desaparecimento de Eusébio e, ao olhar em volta, surge-nos a obra de Filipe Vieira. Enquanto o Benfica tem sido, artificialmente, ano após ano, relegado para 2º plano, Filipe Vieira tem mantido o ânimo dos Benfiquistas, enaltecendo a sua história e os seus atletas, enquanto tem construído o Benfica do futuro. Eusébio já cá não está, mas está o seu legado e uma obra notável que nos permite lutar de acordo com o estatuto granjeado pelo nosso clube durante décadas. E isso é obra do atual Presidente do Benfica. Estou-lhe grato por tal mas sobretudo pela forma honrosa como conduziu as cerimónias  fúnebres.
 
É o fim de um ciclo para o Benfica, sim; é tempo de correr a cortina translúcida do passado e olhar para a frente. Olhar com inteligência e persistência para o que nos rodeia e perceber quais são as alavancas da excelência, mobilizando-as; os melhores Técnicos, os melhores Atletas, a melhor Motivação, os melhores Adeptos, os melhores Aliados, etc. É tempo de abolir uma certa falsa cultura de excelência que reina entre os adeptos e que mais não é do que patetice disfarçada, e fomentar a união por um Benfica maior e melhor onde a crítica inteligente é indispensável. É este o desafio após Eusébio; voltar a subir a montanha da glória.