Desporto

segunda-feira, 25 de abril de 2022

25 da Abril: O outro lado da História

 

Aviltados e traídos: Resposta a Costa Gomes

Mello Machado - Comandante da Operação Pégaso, na Ilha do Como (Guiné)

      “De acordo com os princípios democráticos, proclamados e garantidos pelo Programa Revolucionário, o destino do Ultramar seria decidido pela vontade dos Portugueses de todas as raças e credos.



   Propunha-se um franco e aberto debate, prometia-se a consulta. Num propósito de concórdia e harmonia permanentes, adotava-se um procedimento ainda mais generoso: o poder dispunha-se ao diálogo com os movimentos emancipalistas.

   Foi dada preferência a uma solução política, como se esta pudesse desprezar a sua componente militar. Já vimos a que riscos nos pode conduzir semelhante ambiguidade de conceitos. Mas os riscos assumem diferente dimensão quando os conceitos se pervertem na hipocrisia.

   E provado que as tropas portuguesas - brancas e negras - eram capazes de se bater com extraordinária bravura; que as forças voluntárias africanas as imitavam em valor; que as populações nativas, na sua imensa maioria, se afirmavam portuguesas e conservavam fieis a Portugal - uma fórmula havia para transacionar terras e gentes portuguesas, não em proveito de aspirações que se identificavam com a sua vontade ou com interesses do Povo do Continente ou do Ultramar, mas servindo desígnios ou ideologias alheias ao interesse nacional.

   Por outras palavras, programou-se uma capitulação militar nunca antes imaginada, para que se consumasse a solução política previamente planeada através da renúncia e abandono.”


28 de Setembro; militares seguram a vítima - uma perigosa fasciata, concerteza - que tinham crivado de balas antes e acabaria por morrer.

(Cont.)

Peniche, 25 de Abril de 2022

António Barreto

25 de Abril: O Fator Spínola

 

25 de Abril

O fator Spínola

   O fator que, quanto a mim, foi decisivo no despoletar do processo foi o fator Spínola. Julgo que Spínola andava apavorado com o espetro da derrota militar, que começou a pairar com a intensificação do apoio da União Soviética aos guerrilheiros, em armamento, e de Cuba, em operacionais.

   A Operação Mar Verde terá sido uma tentativa desesperada de reverter o processo através da mudança de regime na Guiné Conacri e da captura ou eliminação de Amílcar Cabral e Seku Touré. Por outro estava prestes a consumar-se o desfecho do julgamento em Tribunal Militar dos militares envolvidos na rendição da Índia; o opróbrio pairava sobre a corporação militar.

   O livro Portugal e o Futuro - quase toda a orgânica que preconizava tinha sido posta em prática com a reforma constitucional de 1971 - funcionou como pré-legitimação do golpe do 25 de abril. Spínola não aguentou a pressão militar e Costa Gomes, então CEMGFA, quanto a mim, era um marxista infiltrado nas FA que foi decisivo na entrega do Ultramar, aos movimentos com vínculo ao marxismo e à União Soviética, e ao abandono das populações - ordenando o baixar de braços às FA que assistiram de braços cruzados à chacina dos portugueses. A decisão de Salazar de o manter no quadro após a participação no golpe de Botelho Moniz em 1961, revelou-se fatal quanto ao Ultramar, mas também quanto ao desfecho do 28 de Setembro; ao alegar, enquanto CEMGFA, que não dispunha de efetivos para desativar as barricadas, foi cúmplice do Partido Comunista no desencadear do PREC. Portugal perdeu a guerra na frente interna, e, sim, foram os comunistas que hoje apoiam a invasão da Ucrânia, os responsáveis, graças, sobretudo à política de abertura de Marcelo Caetano.


Viatura cujo condutor foi abatido pelos militares das barricadas no 28 de Setembro.

Peniche, 25 de Abril de 2022

António Barreto

sábado, 16 de abril de 2022

Inflação

 

Inflação

 (Considerações por um não economista) 

   A Inflação consiste no aumento geral de preços dos bens. Numa economia liberal - onde os preços são definidos pelo livre mercado -, a inflação estabelece-se automaticamente refletindo, a cada momento, o diferencial da evolução entre a oferta e a procura de bens e serviços; em linguagem matemática, a inflação varia proporcionalmente à relação entre as derivadas da procura e da oferta; em linguagem corrente, a inflação aumenta quando a procura aumenta mais do que a oferta e diminui no caso contrário.

   A inflação é um parâmetro importante na monitorização da evolução económica e é, por isso, objeto da atenção dos bancos centrais que, dotados de plenos poderes, procuram mantê-la em níveis considerados economicamente e socialmente sustentáveis - atualmente, em torno de 2 %, na Europa e nos EUA -, dispondo para o efeito, e em exclusivo, de poderosos instrumentos; definição das taxas de juro de financiamento bancário e regulação da quantidade de moeda em circulação - quantative easing.

   Os economistas dizem que a inflação é um imposto escondido; e têm razão, uma vez que o aumento de preços sem correspondência no aumento dos salários reduz o valor dos salários reais. A inflação é, afinal, um mecanismo automático de ajustamento económico.

   As causas da inflação são várias; conjunturais, estruturais, internas e externas. A enorme inflação atual é geral e resulta de uma sobreposição de causas externas, aparentemente conjunturais.

   A redução da oferta de gás natural e petróleo no mercado internacional, resultante das sanções económicas que os países Ocidentais aplicaram à República Federativa Russa, fez aumentar o preço do principal fator de produção, a energia, causa imediata do aumento geral dos preços.

   Esta é uma causa aparentemente conjuntural; em princípio cessará com o termo do conflito militar em curso na Ucrânia, no pressuposto de que o desenlace desta tragédia se traduza na mudança de regime político na Rússia para outro aceite pela comunidade internacional.

   No entanto, o aumento do custo da energia na Europa já se verificava devido à política ambiental em curso - causa estrutural -, que se traduz na redução da oferta decorrente do fecho das centrais e na tributação das emissões de carbono. De facto, as alternativas encontradas além de mais dispendiosas e insuficientes - fontes renováveis - são demasiado voláteis - fontes de origem externa.

   A crise energética sobrepôs-se a outras, decorrentes de dois anos de crise sanitária; desde logo a forte redução da oferta resultante da disrupção da atividade produtiva e das cadeias de distribuição, num contexto de explosão geral da procura que se verificou com o abrandamento da crise sanitária. A procura superou largamente a capacidade de oferta, pensando-se então que o equilíbrio seria restabelecido meses depois. Causa conjuntural.

  Há no entanto uma outra causa mais relevante que qualquer das anteriores; o enorme aumento da quantidade de moeda em circulação que ocorreu na economia mundial durante a crise sanitária. Perante a eminência de crises sociais dramáticas resultantes do colapso produtivo que se adivinhava os Governos decidiram subsidiar empresas e cidadãos recorrendo ao endividamento, respaldados pelos respetivos bancos centrais que para o efeito se dispuseram a fazer as emissões de moeda necessárias.

   O acréscimo de moeda injetado nas economias destinou-se a compensar a redução das respetivas atividades económicas, limitando a quebra dos correspondentes PIB. O acréscimo de moeda não teve, pois, contrapartida do lado da produção. Com a atenuação da crise sanitária e a recuperação económica subsequente para os níveis pré-crise, emergiu a inflação.

   O valor de uma moeda é definido pelo valor da respetiva economia, ou seja, pelo valor total de bens que a sua economia é capaz de produzir e transacionar. Para um mesmo produto - PIB - o valor unitário da moeda diminui sempre que aumenta a quantidade de moeda em circulação na respetiva economia. Foi o que sucedeu em quase todos os países - exceto na China, creio -, incluindo na Europa.

   Grosso modo, considerando apenas a EU, RU, EUA e Japão, cujo PIB agregado deverá situar-se próximo dos 50 biliões de dólares, calculando, em média, 15 % do PIB, o valor do acréscimo de moeda injetado nas economias respetivas - em geral situou-se entre os 10 %  - Portugal - e os 20% - Alemanha, EUA. Japão -, o aumento global de moeda terá sido algo como 7, 5 biliões de USD; o equivalente ao PIB agregado da Alemanha, França e Espanha.

   No caso de Portugal, as políticas económicas introduzidas pelos Governos, desde 2015, centradas no aumento da procura interna induzida pela reversão dos cortes salariais e das pensões, e no aumento administrativo dos salários acima da produtividade, geraram pressão inflacionista, a componente interna da inflação.

   Tendo em conta a marginalidade da economia lusa no âmbito da UE - cerca de 1,5 % do total -, onde vigora uma economia aberta plena, o impacto desta componente na inflação geral, a meu ver é desprezível. O mesmo não sucede na balança comercial de Portugal que voltou a ser deficitária depois de alguns anos de excedente - 2013, 2014 e 2015.

  “Em economia, o ajustamento ocorre sempre”. Não falha! O aumento da procura sem correspondência na oferta, gera inflação e consequente redução de salários.  Como referi, as causas da inflação atual são sobretudo externas, inevitáveis, e aparentemente conjunturais. A integração de Portugal na UE dilui os efeitos inflacionistas resultantes do aumento da procura pela tentadora - e demagógica - via administrativo dos aumentos salariais, sem contrapartida do lado da oferta.

   Porém, se quanto à inflação a economia portuguesa está relativamente protegida de irresponsabilidades internas, o mesmo não sucede no âmbito empresarial; sem capacidade de corresponder em matéria de produtividade, as empresas nacionais soçobram e são substituídas por concorrentes externos.

   Ao fecho das empresas sucede a escassez de empregos, a emigração da população ativa, a redução da taxa de reposição populacional - negativa em Portugal -, a desertificação do país, o crescimento do contingente público, o recurso precipitado à imigração e o agravamento da carga fiscal.

   A correção da inflação, inevitavelmente, passará por uma redução da atividade económica geral, até se estabelecer o novo equilíbrio nos valores considerados “economicamente saudáveis”, cerca de 2 %. Os instrumentos são os mesmos, taxas de juro e financiamento – compra de dívida -, mas em sentido inverso; aumento das taxas, restrições ao crédito e abandono progressivo da compra de dívida pelos bancos centrais.

A correção dos efeitos das várias crises, ocorridas e em curso, é, em si mesma, uma nova crise.

Não adianta escondê-lo.

Deposição de Cristo (Paolo Varonese, 1508/1558)


Peniche, 16 de Abril de 2022

António Barreto