Desporto

sábado, 5 de junho de 2021

O Campeonato Alcochete

 

     Não há campeões sem mérito, é certo. É o caso do Sporting 2020/2021, por ironia, um clube cujos dirigentes têm sido incapazes de reconhecer o mérito aos adversários quando estes ganham, em especial ao Benfica. Mas é verdade, técnicos e Dirigentes do clube verde-branco, pacientemente, em devido tempo, procederam à reestruturação cirúrgica do plantel, que, sem nomes sonantes, haveria de revelar-se eficaz.

   Dos lados da luz, de cofres a abarrotar, ouvia-se o desdenhoso canto das “cigarras”; o regresso de Jorge Jesus, consagrado pelos feitos desportivos realizados no Brasil, juntamente com os novos reforços, alimentavam a esperança em gordos sucessos. Sucessos que, um a um se foram escapando até não restar nenhum! E não só por causas externas. Numa época atípica, sem memória na história do futebol, cheia de peripécias e anormalidades, apesar dos inusitados cem milhões de euros investidos - uma “barbaridade” - o plantel do Benfica revelou-se, surpreendentemente fragilizado em várias posições. A outrora competente estrutura transformou-se, afinal, numa vulgar feira de vaidades.

   Porém, se é de justiça reconhecer mérito às hostes sportinguistas, também é forçoso identificar o contributo de fatores excecionais extradesportivos. Um deles foi o fator Alcochete, outro o Bancário e ainda outro de caris político-institucional.

   Bruno de Carvalho foi um dos grandes obreiros do atual sucesso do Sporting; a tremenda turbulência que a sua gestão induziu, internamente e em todas as esferas do futebol e até bancárias e judiciais, culminou com o inédito episódio de violência de Alcochete. A sua absolvição lançou o pânico no meio sportinguista e do futebol em geral. Nestas circunstâncias, só a vitória no campeonato o manteria afastado da liderança do clube de Alvalade. Foi o que ocorreu.

   No plano económico é sabido que o popular clube verde-branco há muito se encontra tecnicamente falido, vivendo de emissões obrigacionistas e sucessivas reestruturações e perdões de dívida, um modelo insustentável em condições normais, quanto mais num período de forte instabilidade bancária e económica. Falhada a liquidação do empréstimo obrigacionista em 2019, só um salto enfrente, a participação na Liga dos Campeões, poderia garantir o acesso a novos fontes de recursos e ao reequilíbrio financeiro do clube-SAD. Foi o que ocorreu.

   Quanto ao fator político-institucional, recordo uma declaração pública de alguém, segundo a qual seria um desígnio nacional salvar o Sporting. Algo que compreendo mas que me custa a aceitar, antes de mais porque, por várias vezes, dirigentes sportinguistas tudo fizeram para acabar com o Benfica. Por outro lado as competições desportivas não devem ser desvirtuadas para salvar seja que clube for, Sporting Clube de Portugal incluído. Está em marcha.

   Terão estes fatores tido algum efeito no desfecho do campeonato 2020/2021? Não sei. Mas não afasto completamente essa possibilidade.  

  Finalmente, o estado financeiramente deficitário da generalidade dos clubes portugueses - exceção ao Benfica, por enquanto - reflete a falência do atual quadro competitivo do futebol na Europa onde até os chamados “tubarões” estão em graves dificuldades, como o demonstra a recente tentativa da criação da Superliga Europeia. União Europeia e UEFA devem rever todo o modelo competitivo, desde o financiamento à regulamentação económica dos clubes.

André Lhote

Peniche, 5 de Junho de 2021

António Barreto  

Carlos Zel - Fado da Internet