Amarga descoberta
2012.08.04
Toninho da viola, esparramado no
velho cadeirão, emergiu lentamente do suave torpor da tarde. Pachorrento,
levantou-se, bocejou e espreguiçou-se com prazer. Estava, finalmente,
operacional! Reparou nos malotes, malas e sacos em volta, anunciando o breve
regresso. Estoico, encheu o peito, pegando num saco em cada mão e desceu à rua onde estacionara
o VW mesmo frente à porta. - Olhe que isso é muito pesado! Disse-lhe a
norinha, preocupada, face ao volume dos malotes. - É agora pesado! Sabes lá! Tá
aqui um peso! Respondeu brioso! Uma e outra vez subiu a escada; a coisa
corria bem. -Faltam as violas! Mas quem me mandou trazê-las? Estava doido! Pensou contrariado! Finalmente estava pronto! Pronto não! No primeiro degrau
da escada jazia o humilde e solitário, o saco preto do lixo da cozinha! - Á ladrão
estás aí e não dizias nada? Pensou enquanto se dirigia ao contentor do
lixo, mesmo em frente da oficina dos pneus. Aproveitou o levantamento da tampa
pela vizinha e, com uma corridita, arremessou o saco bem para o fundo do
contentor. - Já está! Pensou, esfregando as mãos satisfeito com a façanha que
acabara de realizar, assobiando um velho fadinho.
Já de regresso; - …A Rosalina,
trailarai, larai, lai, lai…grande fado pá! Uma voz…fabulosa! Esta malta de
agora nem sabe o que é o fado a sério! O que
cantam não é fado…é outra coisa qualquer…parece que têm vergonha! Foi o que deu o 25 de abril! Filosofava Toninho, satisfeito com o stock de CDs de que dispunha para a viagem,
confirmando a anuência da “sueca”, já preocupada com o almoço. Ninharias,
pensou. Fadinho após fadinho, CD após CD, lá chegaram a Peniche,
remoendo ambos, a “ladroagem” do aumento da portagem mas ainda a tempo de dar uma
saltada ao escritório.
Declarando-se dispensado da
descarga, dado o esforço despendido na condução, Toninho mudou de roupa e
foi à procura dos sapatos. - Sueca! Onde estão os sapatos? Perguntou a plenos
pulmões. – Estão no saco preto com as minhas sapatilhas, respondeu, ao longe, a
sueca! - O saco preto? Qual saco preto? Não vejo aqui nenhum saco preto! Onde é
que está o raio do saco preto? - Há-de estar aí junto dos outros! Subitamente,
lembrou-se que se cruzara com o seu filho João, quando se
dirigia ao contentor do lixo! - Ai! Querem lá ver? O João vinha dos lados do
contentor! Sentiu um vazio no estômago, perguntando já desanimado: - O saco era
preto? - Era! Disse a sueca. Toninho deixou-se cair pesadamente na cadeira
levando a mão à cabeça. - Olha lá, quanto custaram as sapatilhas? – Sei lá! Aí
uns 30 euros. - E os sapatos? - Não me lembro; se calhar aí outros 30! - Ora 30
mais 30 são 60, mais gasolina, mais portagens, sim senhor! Pensou
perguntando indignado: - Quem te mandou pôr os sapatos no saco preto? - Eu disse-te!
Respondeu a sueca. - O saco preto é sempre para o lixo, não sabes disso? Mudas-te
a rotina e deu asneira! Nunca mais aprendes pá! Desalentado: - Olha lá, o
Benfica joga hoje?