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domingo, 11 de setembro de 2022

Um pouco de História (IX)

 

A República Romana

 

      O sétimo e último período da República Romana é o do cesarismo, dura cerca de 30 anos (de 59 a. C a 29 a. C) e faz a transição para a Monarquia Imperial. As sucessivas revoluções sociais dos períodos precedentes - de Cina e de Sila - deixaram a sociedade romana ávida de segurança e estabilidade, pronta para acolher quem mostrasse capacidade de impor a lei e a ordem. César foi esse homem.

   César, o jovem, culto, elegante, alto, de olhos negros, calvo, efeminado, “o homem de todas as mulheres e marido de todos os homens”, o devasso endividado até “à ponta dos cabelos”, tinha uma ideia para a República em dissolução. Mais que o exercício do poder pessoal César quis unir todo o império e refundar a República. Ao atribuir o foro romano a todos os transpadanos - súbditos residentes além do rio pó - e com a conquista das Gálias, César iniciou um processo que culminou no ano de 212 a. C. quando Caracala atribuiu o foro romano a todos os súbditos do império.

   Enriqueceu em Espanha, onde foi cônsul, graças aos tributos e confiscos, desendividando-se e iniciando a habitual estratégia de corrupção de senadores e figuras públicas, seduzindo o povo com festas opíparas, pagando dívidas alheias e emprestando dinheiro sem juros. Com o financiamento da República, César foi construindo as legiões de que necessitava para tomar o poder em Roma, e, com elas, adquiriu os meios para reconfigurar o senado com aliados e correligionários.

   Membro do primeiro Triunvirato de que faziam parte o sogro, Pompeu, e Marco Crasso, coube-lhe o governo das Gálias, tendo ficado Pompeu com o da Itália e Marco Crasso com o do Oriente.

   Contra as espectativas gerais, em especial de Pompeu que o considerava incapaz de qualquer rasgo de bravura, o jovem estroina ganhava batalhas sobre batalhas. Geralmente em inferioridade numérica conseguiu inverter a sorte da batalha sempre que a derrota parecia eminente, com ideias geniais. Venceu gauleses, bretões, belgas e germanos, pacificando toda a Gália em tempo recorde. Ciente da importância da propaganda, de tudo fazia relatórios romanceados que enviava para Roma, onde eram profusamente difundidos, construindo perante os romanos a ideia de herói da República.

    Após a morte do triúnviro Marco Crasso, que se suicidou, na sequência da derrota de Carra - Mesopotâmia - onde a sua legião foi chacinada pelos partos, liderados por Surena, e seu filho Públio Crasso morto, a rutura entre César e Pompeu era inevitável.

   Desfeitos os elos familiares por morte de Júlia, filha de César e mulher de Pompeu, e do filho destes, esfriaram as relações entre ambos. Fazendo as legiões de Itália jurar-lhe fidelidade, Pompeu afirmou-se como ditador, cônsul único e absoluto senhor do Senado. Faltou-lhe porém a coragem de demitir César do comando da Gália. Tal revelar-se-lhe ia fatal.

   O partido conservador, reunindo nobres, cavaleiros, catonianos (fiéis de Catão) e oligarcas, reuniu-se em torno de Pompeu apesar de não confiar nele. César tinha do seu lado os democratas radicais, os transpadanos, que fizera cidadãos de Roma, e as suas legiões; sobre as ruinas da inconvertível república iria erguer o principado democrático e socialista.

      César, congeminando neutralizar Pompeu com honrarias logo que assumisse o Consulado, decidiu-se pela guerra ao perceber que os catonianos tinham um plano para o afastar; acusá-lo-iam no interregno de funções, tornando-o inelegível ao consulado - em exercício de funções os magistrados eram inimputáveis. Tão exímio na intriga política como genial na guerra, César conduziu o Senado a tomar decisões que levaram Pompeu a colocar-se fora da lei e sair de Roma para se colocar à frente do seu exército, numa implícita declaração de guerra.

   O futuro tirano sabia que tinha de agir com rapidez; Pompeu tinha meios para reunir um exército triplo do seu. Com um ultimato, César dividiu o Senado em catonianos, fieis a Pompeu, e cesaristas, fieis a César. Ravena, situada na Cisalpina, província sob sua jurisdição, foi o seu quartel-general. Aqui se juntaram os tribunos populares que lhe eram fieis e as suas legiões, prontas a marchar sobre Roma. Paradoxalmente, iria destruir a constituição…cumprindo a lei! É o jesuitismo na política.

   “ O cesarismo que perverte a noção clara das coisas, que torce a justiça, que corrompe a moral, que esmaga com a Razão-de-Estado as constituições e as leis, começa por ser a vitória da intriga sobre a franqueza para depois se tornar na vitória da força sobre o direito – vitória todavia inevitável quando as sociedades chegam ao ponto a que chegara a romana em que moral, justiça, direito, constituição, leis, são para o comum da gente ficções apenas e só realidades para a minoria mínima dos retrógrados visionários à maneira de Catão.” (Oliveira Martins)

  Reunindo em Ravena a sua 13ª legião, César dirigiu-se aos soldados com tal retórica que os convenceu, não só a aderir entusiasticamente à sua causa, mas a fazê-lo gratuitamente e até a financiar a campanha, num modelo em que os Centuriões mais ricos pagavam os encargos dos outros. Confiantes no farto saque sobre a cidade, não suspeitavam sequer que tal seria interdito pelo Procônsul bem como violentar as populações das cidades tomadas.

   Num turbilhão de sentimentos e dúvidas, César decidiu-se a passar o pequeno rio Rubicão com as suas tropas exclamando: “- Alea Jacta est” (os dados estão lançados).

     (Continua)

 

Cneu Pompeu Magno

    Peniche, 11 de Setembro de 2011

    António Barreto