Desporto

sábado, 4 de abril de 2015

Venha o próximo!

      Um Benfica avassalador até ao três zero, altura em que alterou o processo de jogo para passivo, suscitando a reação do Nacional, que, praticando um futebol de qualidade, fez o seu golo de honra proporcionando um excelente momento de futebol; remate fulminante de meia-distância, colocadíssimo, indefensável para Júlio César.
 
      De facto, a equipa encarnada ostentou uma dinâmica coletiva, uma qualidade de passe e um sincronismo que baralhou totalmente os adversários, proporcionando três excelentes golos, em especial, o de Jonas - que não é inédito nele -, com poderoso e colocadíssimo remate à entrada da área a passe de Sálvio, inapelável para o guarda-redes adversário. Fantástico! 
 
      Ao contrário dos jogos com o Paços e o Rio Ave, desta vez as alas funcionaram bem, salientando-se a preciosa criatividade de Gaitan, bem como a precisão dos centros que efetuou e que renderam um bonito golo a Lima. Já o primeiro golo resultou de outra qualidade que esteve ausente nos jogos referidos atrás; a capacidade de recuperação coletiva. De facto, desta vez, ao perder a posse da bola, todos os jogadores encarnados recuperavam no terreno pressionando os adversários, para retomar o processo ofensivo interrompido. Foi na sequência de uma destas recuperações, por Gaitan, que num lance repleto de determinação, inteligência e técnica, surgiu o primeiro golo; um pequeno truque de pés de Sálvio retirou o defesa do lance enquanto o inteligente Jonas deu um passo atrás, desmarcando-se, abrindo a linha de passe ao colega e rematando cruzado de primeira. Bonito!, arte em movimento.
 
      Depois, a equipa aliviou a intensidade, processo que não domina, e o Nacional, que sabe jogar, subiu no terreno, meteu gente no meio-campo e no ataque, marcou e ainda suscitou preocupação. Merecem os parabéns os nacionalistas pela postura que tiveram no terreno, com ambição e talento, proporcionando um bom espetáculo de futebol, que é o que os adeptos pretendem e pode salvar o futebol nacional.
 
      Jonas e Gaitan estiveram em destaque, Lisandro fez bem a posição, e Sálvio também esteve bem, apesar de aparecer demasiadas vezes em zonas que não são as suas. Este esteve ainda muito bem num lance, bem na área adversária, em que inventou uma finta daquelas de que gostamos, porque raras e eficazes. 
 
      Julgo que não há nada a apontar a Carlos Xistra. Talvez no lance que referi anteriormente, o defesa do Nacional tenha cometido falta, uma vez que, sentindo-se fora do lance, impediu a progressão de Sálvio empurrando-o no peito com as duas mãos, simulando uma agressão inexistente.
 
      Talisca lesionou-se, espero que sem gravidade, e poderia tê-lo evitado, se não tivesse encetado um lance pateta em que resolve desgastar-se, transportando a bola transversalmente, sem qualquer racionalidade.
 
      Uma curiosidade; o autor do golo do Nacional parece que está emprestado pelo Porto, tal como, salvo erro, é o caso do Ukra, sendo esta uma estratégia corrente do nosso, agora, principal rival, a quem não basta o desempenho da sua equipa no terreno de jogo.
 
      Venha o próximo!
 

Pie Jesu

 
 
 
 
 

Manoel de Oliveira não morreu

      Saber que Manoel de Oliveira andava por aí a fazer cinema, desafiando a eternidade, suscitava-me uma tranquila e silenciosa satisfação, e também esperança. A serena satisfação pelo tremendo respeito, sempre patente, que granjeara no panorama do cinema mundial desde o seu fascinante e perene documentário sobre o rio Douro. A esperança advinha do seu raro empenho em interpretar e difundir episódios marcantes da História de Portugal, como o de Alcácer Quibir. Julgo que, na linha de Camões, Pessoa, Agostinho da Silva, José Gil, Eduardo Lourenço e outros, sentia necessidade de procurar, profundamente, as características e vicissitudes da nação portuguesa, a essência que vem da fundação da nacionalidade e lhe pode dar sentido, num tempo pós-império em que o lugar de Portugal no mundo parece condenado à subalternidade e irrelevância. Não sei se o conseguiu, é um caminho que terei de percorrer como puder, tentando perscrutar e interpretar o seu pensamento. Longe vão os tempos em que tínhamos a secreta satisfação de fazer parte do universo de intelectuais como António Lopes Ribeiro, Pedro Homem de Melo, Vitorino Nemésio, Natália Correia, David Mourão Ferreira e outros, que se preocupavam em dirigir-nos a palavra a partir da nossa TV. E isso fazia-nos bem; hoje parece não haver lugar para estas conversas. E como precisamos delas!

      Mas Oliveira preocupava-se sobremaneira com o cosmos do ser humano, debruçando-se sobre os mecanismos afetivos próximos ou implícitos. O seu génio convocou gente histórica no cinema universal, como Catherine Deneuve, John Malcovich e esse "monstro" de Fellini, do célebre sete e meio, o eterno ator do fascinante cinema italiano, Marcello Mastroianni. E "fabricou" atores que ficarão na história do cinema nacional, dos quais se destacam a Teresa Madruga e Luis Miguel Cintra.

      Compete-nos a nós impedir a morte de Manoel Oliveira, partindo à descoberta da sua obra, à descoberta do homem por detrás dela e do mundo que tentou revelar. Na verdade, não posso deixar de prestar homenagem a seu pai que teve a sabedoria de lhe oferecer o "brinquedo" certo; uma maquinazinha de filmar com a qual Manuel de Oliveira fez a sua obra-prima, demonstrando desde logo as origens da arte.  Por simpatia, recordo Juan Manuel Serrat, que, com seu talento, ganhou lugar de honra na música hispânica, com projeção mundial, graças à guitarra que seu pai, um dia, lhe ofereceu! E aqui está como pequenos gestos, se acompanhados de perspicácia e afecto podem mudar o mundo.

       Estou grato a Manoel de Oliveira e não sinto que tenha morrido. Recordo a ideia que dizia ter da morte; dizia que não tinha medo dela, porque era um descanso.

      Obrigado Manoel de Oliveira