Desporto

domingo, 28 de outubro de 2018

O 25 de Abril Visto da História (notas P6)


 
O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais
 

 
….O voto PS, se o voto tem alguma coisa a ver com a prática política dos partidos, então não deixará de ser entendido, prioritariamente, como um voto anti-PCP. …(JAS)

   Foram, pois, os excessos cometidos pelo PCP no período que ficou conhecido por PREC - com a ocupação do aparelho estatal, o domínio dos quarteis, os saneamentos nas empresas, as violações da propriedade privada, as ocupações dos principais jornais - com a “curiosa” participação de José Saramago -, as prisões arbitrárias dos seus aliados do COPCON, a agitação social marginal da sua excrescência sindical, a Intersindical, etc. - que suscitaram o afrontamento do marginalizado PS que lhe viria a granjear confortável maioria nas eleições para a Assembleia Constituinte, seu principal capital político até aos dias de hoje. A ironia atual reside cedência do PS ao PCP pela imperiosa necessidade daquele ascender à governação.

…Torna-se claro que muitos dos atuais dirigentes socialistas são “velhos republicanos”. Entre o PS de hoje e o Partido Republicano de então existem, de resto, aproximações que, podendo não passar de coincidências, não deixam de ser curiosas. …(JAS)

   É certo que até Mário Soares invocou a herança de Afonso Costa sendo recorrente, entre socialistas, as referências à famigerada e duvidosa “ética republicana”. Por outro lado, as ligações à maçonaria de notáveis do atual PS - Vasco da Gama Fernandes, João Soares, António Arnault, José Magalhães, entre outros - também ajudam a consolidar esta tese. (AB)

…durante a I República o desajustamento entre o Estado e a estrutura da sociedade portuguesa terá sido o maior que alguma vez se verificou em Portugal. Veja-se, apenas, o anticlericalismo radical dos políticos republicanos - um fenómeno tão artificial quanto é certo….que o país continuava a ser, na sua grande maioria, um país católico….Por outras palavras, em que medida é que o “espírito do 25 de Abril” correspondeu a um ajustamento do Estado à sociedade Portuguesa. …..se, entre 1910 e 1926 a sobreposição entre a República e o Estado foi uma situação artificial, então é perfeitamente natural que certas lutas que foram da República mantenham ainda hoje uma certa atualidade. (JAS)

   Não há dúvida que o anticlericalismo está bem patente no atual PS, bem como nos restantes partidos de esquerda, não tão radical como então, mas sistemático e persistente. Donde - até pela predominância da doutrina de esquerda no articulado da Constituição - a consagração do Estado Laico, aceitando-se pela defesa do princípio da não discriminação religiosa, não deixa de ser uma afronta à cultura popular dominante, hoje, paradoxalmente, em risco de sujeição à intolerância do islamismo.

…Os mais destacados dirigentes do Partido Socialista português são normalmente oriundos das classes médias e exercem, por outro lado, atividades sem ligação direta, a maior parte das vezes, ao setor produtivo….(VJS)

   Esta característica não é exclusiva do Partido Socialista; ela está presente em quase todos os partidos, grandes ou pequenos. A pequena e média burguesia ou a administração pública são as fontes donde tem brotado o caudal humano político em Portugal. Só o Partido Comunista, nos primórdios, integrava quadros oriundos do operariado ou do campesinato. Quanto a mim, há uma explicação para isto; o povo, operários e camponeses, antes de mais, têm que garantir a sua sobrevivência, o que lhes ocupa todo o tempo disponível. Há poucas décadas atrás muito pouca gente tinha salário; o ganha-pão tinha que ser “arrancado” à terra e ao mar em cada dia por todos os membros da família, desde tenra idade. (AB)
(foto: Peniche, na Praia do Quebrado)
Peniche, 27 de Outubro de 2018
António J.R.Barreto

O 25 de Abril visto da História (notas P5)



 O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais

….constata-se claramente que grande número de partidos que enquadraram politicamente o Boom neocapitalista na Europa do pós-guerra se mostram hoje incapazes de responder, por um lado à dinâmica “integracionista”, e por outro, ao repto de uma esquerda que se adaptou ao terreno da democracia burguesa e aposta a sua cartada no jogo eleitoral….(VJS)

   Em linha com AJS; parece que os socialistas modernos se caracterizam pela falsa adesão às democracias, com o propósito de, pela gradual e sistemática via reformista, atingir os objetivos da sua ideologia, garantindo a adesão do eleitorado graças à prática, insustentável embora, da redistribuição. (AB)

…..O poder operário, se existe - e existe - é, repita-se, nos países ocidentais industrializados – onde o operariado, de facto, tem já nas suas mãos (e não nas polícias do Estado) uma parte do poder…… (JAS)

   Talvez seja esta a justificação do célebre “quanto pior melhor” atribuído ao tradicional comportamento político do PCP; o atraso económico garante-lhe maior audiência junto do eleitorado. “Com efeito, o estalinismo impõe-se como o reverso da medalha do salazarismo, enquanto totalitarismos de sinal diferente - e que reciprocamente se justificam – e enquanto expressões de atraso económico-social e político”. (AB/VJS)

…Na verdade, enquanto nos países onde o movimento social é forte, os partidos aparecem sobretudo como emanações do corpo social, como expressão das tensões existentes no seu interior, em Portugal, os grandes partidos surgem menos como “expressões orgânicas” do movimento social - que é débil - do que como figurinos importados do estrangeiro…(JAS)

   É esta uma incontestável realidade; só agora - em 2018 -, graças aos efeitos da crise económica de 2008 e da consequente radicalização dos tradicionais partidos, a sociedade revela sinais de criar a sua genuína dinâmica política emergindo vários novos partidos e movimentos; é o caso do Democracia 21, do Partido Liberal, do Partido Nacional Renovador, do Partido Aliança, do Movimento Por Uma Democracia de Qualidade, do Movimento Não nos Calamos, do Movimento Chega, e outros. O domínio do aparelho estatal pelos “velhos” partidos e os constrangimentos da “engenharia” constitucional na esfera partidária, porém, eventualmente, inviabilizarão a sua ascensão. Tal, a verificar-se, constituirá a derradeira condenação à morte desta 2ª, ou 3ª, República.

….O PS, que até certa altura tinha vindo a atuar com muita cautela, evitando a todo o custo a marginalização - recorde-se o seu apoio à nomeação de Vasco Gonçalves para o cargo de primeiro-ministro …em prejuízo de Firmino Miguel, o candidato de Spínola - toma agora ele próprio a iniciativa de se demarcar em relação do Poder constituído, passando mesmo a afrontá-lo diretamente…. (JAS)

   Fica pois assente a atenuação da responsabilidade de Spínola na desastrosa nomeação de Vasco Gonçalves para o primeiro-ministro do primeiro Governo pré-constitucional, que revolucionaria a estrutura económica e patrimonial do país conforme o modelo estalinista, ainda hoje não totalmente erradicado. Pelo contrário, confirma-se o alinhamento inicial do Partido Socialista com o Partido Comunista, tornando-o corresponsável pelo descalabro revolucionário. Por outro lado, a posterior dissidência do Partido Socialista teria tido mais a ver com a marginalização a que fora votado pelo PCP, que assumira o controlo do processo, do que por “amor à genuína democracia liberal. (AB)
(Praia de Peniche de Cima)
Peniche, 26 de Outubro de 2018
António J. R. Barreto

O 25 de Abril Visto da História (notas P4)



O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais

…Quando Portugal dispõe, na América, de uma das maiores e mais ricas colónias do mundo - o Brasil - são empresários portugueses que controlam, cá dentro, a maior indústria portuguesa do tempo: os vinhos do Porto. …(JAS)

   É verdade. Foi pela 2ª metado do século XVIII, por ocasião da pré-revolução industrial em que a Inglaterra protagonizava um tremendo desenvolvimento da indústria da tecelagem, com envolvimento da sociedade civil e da Coroa – surgiram então as primeiras PPP na construção e desenvolvimento da rede viária e fluvial para escoamento da produção do carvão e dos têxteis, culminando na mecanização das máquinas de tecer com máquina a vapor, com a constituição das primeiras fábricas e consequente migração dos camponeses para as cidades – que a transformaria no maior produtor mundial. Foi neste contexto que Portugal – através do Marquês de Pombal que haveria de criar a primeira região produtora demarcada do mundo – do Douro, que acabaria por resultar no “Massacre dos Taberneiros”-, estabeleceu um contrato de comércio com a Inglaterra mediante o qual Portugal lhes compraria todos os têxteis de que necessitasse e lhes venderia todo o vinho que produzisse, em regime de exclusividade. O célebre economista David Ricardo haveria de defender os benefícios mútuos deste contrato calculando a razão de troca em 3 para 5; por cada unidade investida, Portugal ganharia três e a Inglaterra cinco. Aqui reside a desvantagem lusa, que haveria de conduzir ao empobrecimento do país ao excluir economias que possibilitariam melhores condições de comercialização. A verdade é que, por esta época, a Inglaterra já era o principal beneficiário do comércio do império colonial português; pelos fretes das mercadorias e policiamento das frotas, bem como pelos serviços de seguros das mercadorias, limitando-se Portugal a cobrar os direitos alfandegários e as taxas portuárias, sem intervenção direta na exploração colonial. Após a vitória sobre a célebre Armada Invencível, com a destruição e afundamento de numerosas naus portuguesas, A Inglaterra dominou os oceanos até à I GM, sendo então superada pelos EUA no domínio marítimo.

…Significativamente, há hoje quem defenda que Portugal morreu (deixou de ser viável) como país independente, na medida em que, como disseste, deixou de dispor de “válvulas de escape” – situa-se neste campo, por exemplo a União Ibérica, mas não só…..(JAS)

….Neste momento, na Europa, parece de facto em vias de constituição uma nova força – que seria formada por partidos comunistas, socialistas e mesmo sociais-democratas, quer de Leste quer de Oeste cujo combate se travaria em duas frentes: por um lado contra o conservadorismo de Moscovo e o seu papel de “Estado-guia”; por outro, contra a hegemonia americana na Europa e os partidos conservadores do Ocidente (como as Democracias Cristãs, os Conservadores ou os Liberais)….(JAS)

   Esta previsão deve ter-se, pelo menos em grande parte, concretizado, considerando o asfixiante centralismo que a União Europeia impõe aos Estados membros, transformando os seus governos em meros agentes executivos das suas intermináveis diretivas, sobrepondo estes à sociedade Civil, condicionando a liberdade económica ao “planeamento central” conforme a visão do mundo da elite constituinte do Conselho Europeu, imiscuindo-se, cada vez mais, em cada detalhe da vida dos cidadãos. Uma clara herança do extinto totalitarismo soviético, que, sobretudo a partir de 1989, deverá ter espalhado na Europa, algumas “metástases”.
Peniche, 25 de Outubro de 2018
António J. R. Barreto