Desporto

domingo, 31 de janeiro de 2016

Crise "arábica"

     Talvez ninguém perceba na plenitude o que se passa hoje no médio oriente; há demasiados atores em jogo e nem tudo é o que parece; Estados totalitários como o Iraque a  Líbia e a Síria constituíam uma ameaça permanente à "ordem internacional", fosse pelo radicalismo da sua postura relativamente aos países Ocidentais, fosse pelo seu alegado envolvimento no apoio ao terrorismo internacional, fosse pelo desígnio de domínio regional. 
  
   Para George W. Bush faziam parte do célebre "eixo-do-mal" tendo o atentado e destruição das Torres Gémeas constituído pretexto para o derrube do regime de Saddam Hussein e a instituição de uma espécie de democracia no Iraque de que se esperava um efeito de contágio na região. A realidade mostrou-se bem diferente; um governo de reduzida legitimidade, fustigado por episódios de violência  oriundos de fações de excluídos cuja derrota se revelou impossível. As forças americanas, atascadas naquele atoleiro bélico acabaram por retirar na sequência da eleição do democrata Obama e das suas promessas eleitorais.
 
   Com as "primaveras árabes" acreditou-se, por cá, que seria o princípio do fim dos totalitarismos regionais. Tunísia, Egipto, Líbia e, finalmente, a Síria, foram os países atingidos pelo "fenómeno". Tudo parecia correr de feição até ao caso Sírio, onde Bashar-al Assad, à beira da derrota, tem revelado uma resistência inesperada, graças, sobretudo, ao apoio russo.

   Já percebemos que a guerra na Síria concentra uma multiplicidade de conflitos de grande amplitude e importância estratégica com elevado potencial de alastramento e imprevisibilidade.

   A mudança de regime no Iraque parece ter produzido umas centenas de milhar de apátridas inconformados, com preparação e condições para desenvolver ações militares de envergadura regional com o propósito de implantar um novo Estado, monolítico de cariz religioso. Além da preparação e meios - consta cerca de 400 mil soldados e 12 mil oficiais do antigo exército iraquiano -, têm concitado a adesão de radicais islâmicos pelo terror e barbárie, conseguindo controlar zonas consideráveis e demonstrar capacidade de expansão territorial. Os recentes acontecimentos de Paris e outros, precedentes, mostram, que as suas ameaças de ação no coração da europa são para levar a sério.

   Do lado russo, apesar de surgirem como aliados da europa neste conflito, parece que, acima de tudo, estão interessados em proteger a sua posição na região através do apoio a Assad e em retaliar, indiretamente, contra o embargo económico que lhes foi imposto pela União Europeia.

   Também o papel dos EUA neste conflito é algo dúbio; se por um lado visa estabilizar politicamente a região e o abastecimento do crude, por outro lado, há, quanto a mim, um interesse  dissimulado em criar dificuldades à UE, cuja moeda constitui uma ameaça efetiva ao domínio do dólar e à hegemonia americana.

   Também me parece que a decisão de Francois Holande de mandar bombardear a Síria, teve por finalidade primeira, não o propósito de contribuir para o saneamento do conflito, mas o de inverter o declínio da sua popularidade junto da opinião pública  francesa em consequência do abandono das promessas eleitorais que o conduziram à vitória eleitoral. 

   Por tudo isto, parece evidente que a invasão maciça da europa por um fluxo contínuo de refugiados interessa aos seus principais concorrentes económicos e inimigos políticos, deixando em aberto a possibilidade de, aquela, constituir o principal alvo deste conflito. Os casos de espionagem informática de que a Alemanha foi alvo por parte dos EUA, da Rússia e, creio que, até da China, indicam-nos estarmos perante uma nova guerra fria entre os principais blocos económicos, na qual, os sucessivos e múltiplos acordos de cooperação, parecem ser contraditados pelas incidências dos permanentes conflitos regionais.    

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

A Destreza das Dúvidas: Nem de propósito...

 "Agora percebe-se a lógica de adiar o pagamento ao FMI: Mário Centeno tinha a certeza de que Portugal não conseguiria emitir dívida a juros baixos. Sem o rating da Fitch, o BCE não pode comprar dívida de Portugal no mercado secundário. O BCE teria de arranjar uma maneira de abrir uma excepção para ajudar Portugal, mas isso seria difícil e complicado. Mais uma vez, recorremos a dívida para manter um regime insustentável, e não para gerar crescimento.

Portugal aproxima-se a passos largos de outro desastre, mas desta vez não há qualquer dúvida: os responsáveis são os nossos líderes, não é a conjuntura internacional. Resta saber se haverá alguém com poder disposto a parar esta nova loucura e quem será cúmplice. Está na hora de as pessoas e a comunicação social decidirem de que lado da História irão ficar." (Rita Carreira, Destreza das Dúvidas)

A Destreza das Dúvidas: Nem de propósito...: " Fitch ameaça descer "rating" de Portugal se Costa falhar redução do défice A agência de "rating" considera que...

(Tela de Júlio Pomar)

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Igualdade

   "A ideologia que conduziu à edificação dos regimes socialistas é a ideologia da igualdade. Trata-se, porém, na igualdade nos resultados, ou seja, a igualdade de rendimentos, riqueza e condições de vida. Os países democráticos com economia de mercado puseram em prática, e fixaram como objetivo, a igualdade perante a lei e a igualdade de oportunidades. A busca do primeiro tipo de igualdade reveste aspetos utópicos, é muito mais difícil de alcançar do que as outras duas, implicando, sobretudo, custos consideráveis, em matéria económica, moral e política.  Para a sociedade em geral, traduz-se principalmente em perda de motivação e de gosto pela inovação, pois o facto de ser limitado o enriquecimento material de um indivíduo provoca uma perda de dinamismo económico. Depois, a busca da igualdade de rendimentos e fortunas implica um sacrifício em termos de justiça, porque esta deverá necessariamente opor-se àqueles que se elevam materialmente acima do grupo (como o exemplo na Rússia dos Kulaks mostrou). Enfim, este tipo de igualdade exige um considerável sacrifício da liberdade: as liberdades individuais (económicas, obviamente, mas também políticas) têm de ser severamente reduzidas para atingir o objetivo da igualdade (o caso soviético também ilustra perfeitamente essa situação).
Jacques Brasseul, História Económica do Mundo

Tela representando Prometeu, figura mitológica grega agrilhoado por Zeus por favorecer os humanos em detrimento do dever de lealdade, salvo por Hércules que ofereceu em troca o sacrifício do Centauro Quiron.

domingo, 24 de janeiro de 2016

Pequenos Estados, fracas instituições

"...pequenos estados têm instituições fracas que deixam surgir zonas de não direito, zonas cinzentas, expostas a guerras e a poderes mafiosos. A debilidade do Estado  impede o bom funcionamento da economia de mercado, os custos de transação aumentam e o desenvolvimento económico é bloqueado." 
 
Jaques Brasseul, História Económica do Mundo
 
Tela de Alfredo Roque Gameiro

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Turismo mata!

   "...Fabiana Pavel considera que a "turistificação" do Bairro Alto em Lisboa, está a levar os moradores a sentirem-se "quase obrigados a sair....A Arquiteta, que se doutorou na Universidade de Lisboa,...em 2013 fez um levantamento porta a porta no bairro e verificou a existência de um lugar/cama por cada dois residentes. Hoje já devemos estar estar um por um, há o risco de os turistas passarem a vir cá ver os turistas", alerta." (Correio da Manhã, 17 de Janeiro de 2016)
 
 
   No princípio, a praia era dos indígenas, vieram os turistas e os indígenas eram afastados, para não incomodar.  Para não incomodar, afastaram-se os botes para perto das canhoeiras, primeiro, para a marina, depois. Desclassificou-se a praia como porto de pesca, enviaram-se as traineiras para a Gala. Já não há barcos na praia. Quase não há, pescadores, lá. Nem enseada. Nem penedos. Há calhaus, avenidas e parques de estacionamento sobre a praia, outrora da claridade. Há cortejos  incessantes de viaturas vomitando poluentes. Há custos de residência exorbitantes que afastam os indígenas para bem longe. Há oportunísticas manobras administrativas que afastarão, em definitivo, os indígenas do pouco poder que lhes restava. Há a insaciável voracidade do centralismo vizinho. Acontece em Buarcos, aos olhos de todos! Ante o silêncio de todos! De Buarcos, São Julião!!! 

   Acontece nas mais belas povoações do litoral português, cada vez menos ao serviço das populações locais.
 
Do Blogue Marintimiidades, de Ana Maria Lopes:
 
 
É o caso desta, passada em Buarcos, pelos anos oitenta que sempre me deixa saudades, pela vida que ornamentava o nosso litoral. Menos meios, vida mais precária, mas mais riqueza e beleza antropológica e etnológica.
Chegada a Buarcos, à procura do dito bote de Buarcos, à volta do primeiro decénio deste século, o desânimo invadiu-me. O que é feito dos botes que daqui saíam para o mar de uma forma encantadora? Seduziu-me este recanto, pelos anos oitenta, noutra investida remota de inquirições.
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Areia deserta, mar deserto, ninguém na praia, sequer, a quem perguntar.
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Nos anos sessenta em Buarcos, o bote tinha «grosso modo» a silhueta dosbotes do bacalhau. E não é por acaso que isto acontece. Desaparecidos gradualmente os navios de pesca à linha do bacalhau, os dóris ou botes, construídos nas carpintarias das empresas por hábeis carpinteiros, foram perdendo a razão de existir. Construção simples permitia que em alguns pormenores não fossem totalmente iguais, mas as suas dimensões principais geralmente eram respeitadas: 5,30 metros de comprimento, 1,50 m. de boca e 0,60 m. de pontal. Alguns museus marítimos exibem-nos com orgulho, como o da Póvoa de Varzim, o de Ílhavo e o Museu de Marinha, em Lisboa.
Em algumas das localidades que forneceram homens para a pesca do bacalhau (Costa Nova, Gafanhas, Cova/Gala e outras), foram transferidos alguns para a pesca local, sofrendo algumas modificações.  

 
Na Costa Nova, na apanha do crico. Anos 80

 
Aos poucos, foram abandonando o tabuado trincado, recebendo à popa um banco em U, e passaram a ter bancos fixos, ganhando castelo de proafechado por portinhola e popa, mais larga, com um pequeno motor.
Pelos anos 80, a silhueta do bote foi abrindo, pois as águas a que se destinava não eram as mesmas e o comprimento também excedeu os 5 metros.

 
À espera e à conversa, na praia…Anos 80

 
Em Buarcos, assistimos ao encalhe do último bote daquele dia, puxado por uma junta de bois que todos os dias se dirigia à praia com aquela finalidade. A dona da junta fazia este trabalho há 40 anos, desde que se casara em Buarcos e recordou a existência de grandes bateiras (maiores que os botes) e de lanchas poveiras (ainda muito maiores).

 
Junta de bois a varar o bote, em Buarcos. Anos 80

 
O bote era utilizado para a rede de um pano para a faneca, para otresmalho (rede de três panos) para o linguado, sargo, robalo, etc., para oaparelho a que chamavam troles com muito inzóis, para a linha de mãopara o safio e para os cofos.
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Que encanto! Como vemos, a venda do peixe era feita na praia directamente aos banhistas, colaborando a mulher com o marido na separação do peixe e sua pesagem.

 
O peixeiro a pesar… Anos 80
 

 
 
 
 

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Notas saltitantes

   A exibição do Benfica contra o Marítimo mostrou uma nova dinâmica ofensiva, em muito, devido ao contributo de Carcela que acrescenta criatividade, profundidade, e precisão nos cruzamentos e assistências, aumentando o grau de incerteza na defensiva adversária, criando espaços para a entrada dos colegas ou induzindo o adversário a cometer faltas fatais. 

   Carcela, Jonas e Jimenez, entenderam-se muito bem, faltando apenas mais concentração a este último nos dois lances em que tinha só o GR pela frente. Contudo, falharam-se muitos passes e, na primeira meia hora, cometeram-se erros defensivos que poderiam ter mudado a história do jogo.
 
   Não é necessário andar aos gritos por tudo e por nada nem violentar a autoestima, mas, atletas e adeptos, têm que ver um líder no seu Treinador. Nesta matéria, RV não tem sido eficaz apesar dos bons sinais no lançamento deste jogo.
 
   Jorge Jesus, ainda embevecido com os êxitos que conseguiu nos dois últimos anos no Benfica e os recentes "sucessos" no Sporting, não pára de dizer patetices; já se esqueceu que seria hoje um treinador de meia-tigela se o Presidente do Benfica não tivesse dado o corpo às balas apoiando-o. Revela ingratidão para quem o levantou do chão. Nem sequer se apercebe das baboseiras que profere; por que carga de água se incomoda a fazer sair da "toca" alguém a quem não reconhece estatuto de treinador? Gaba-se de ter ganho três jogos aos encarnados esta época fingindo ignorar que a sua equipa beneficiou da fase de transição técnico-tática daqueles e de ajudas suplementares. Fica sabendo que não voltará a consegui-lo esta época. 
 
   Vai uma grande barafunda pela invicta relacionada com o tráfico de droga e a segurança ilegal. Oxalá, desta vez, a Justiça não se deixe subverter por infiltrados  e cumplicidades e faça o que lhe compete; julgar e condenar os culpados dos crimes em causa. É que, nós, simples cidadãos, sem conhecermos os casos em concreto, percebemos-lhes os contornos desde há décadas. Quem se atreve a não beneficiar um clube que tem ligações, ainda que informais, a uma rede de malfeitores que, impunemente, espalha o terror pelo país, ameaçando, agredindo e, segundo consta, matando pessoas?  Como se compagina isto com a democracia moderna? É a credibilidade do Estado que está, mais uma vez, em causa, pois parece que a Justiça não é geral e universal.
 
   O Novo Banco, que despede e arruína milhares de pessoas, tem uma "bota" para descalçar; vai ser interessante ver a solução que vai adotar quanto aos 55 ME do empréstimo ao Sporting, que vencem no próximo dia 27!, como se trata de obrigações convertíveis, e, naturalmente, não estão interessados em envolver-se na gestão do clube, palpita-me que irão anuir às pretensões de Bruno de Carvalho. Naturalmente, contarão com a benevolência dos comentadores, grande parte deles, afetos ao "universo" verde. Depois do "escândalo" político no caso da redução das taxas da Câmara de Lisboa relativamente ao museu Cosme Damião, imagino o foguetório que seria se o caso fosse com o Benfica! Obrigações convertíveis, com juros condicionados à distribuição de dividendos? Com o banco envolvido em situação crítica e os portugueses com o credo na boca? É demasiado óbvio! E escandaloso! Tenham vergonha!
 
Foto de José Manuel Antunes em A Bola http://www.abola.pt/clubes/ver.aspx?t=3&id=591283

“O Benfica é e sempre foi um clube extraordinário e admirável."

   O recente naufrágio do arrastão Olivia Ribau à entrada da barra da Figueira da Foz trás à memória um outro episódio com quase 60 anos. Na altura, o naufrágio da traineira "Nova Leirosa" trouxe grande consternação e o Sport Lisboa e Benfica, nessa já distante época de 1958/59 colocou-se à disposição da Associação Naval 1º de Maio, clube com fortes ligações aos pescadores e tradicionalmente apoiado por estes, para honrar a memória dos falecidos e angariar verbas para apoiar as suas famílias. 


   Assim sendo, deslocou-se pela quarta vez na sua história à Figueira da Foz para defrontar o clube navalista, sendo a primeira em que entraria no Estádio José Bento Pessoa.
 
   Na foto podemos ver José Águas a entregar uma oferta ao filho de um dos falecidos na tragédia. 
Perante um estádio lotado, o Benfica, já com a base do futuro Bicampeão Europeu, venceria por 5-1.
Mais uma vez, o Sport Lisboa e Benfica conquistaria o coração dos figueirenses.
  
   Aos mais distraidos, era por vezes difícil de explicar o porquê de tão grande concentração de Benfiquistas na Figueira da Foz, ora bem, várias coisas contribuiram para tal, a começar pelo facto de dois dos constituintes da célebre "trindade navalista" terem actuado no Benfica, o gr Pinto Machado e o central António Maria, sendo que o outro elemento, Tó Pinto, era um reconhecido Benfiquista. Este jogo, bem como o de 1951, assim como a cedência de Bastos para que jogasse pela Naval também num jogo de cariz solidário, bem como as ligações do extraordinário ciclista figueirense Alves Barbosa ao Benfica, do qual chegou a ser treinador, ajudam também a explicar este facto.
 
   Muitos anos mais tarde, em 1997, a sede da já então centenária Associação, arderia por completo. Mais uma vez, o Benfica se deslocaria à Figueira da Foz para um jogo solidário.
 
   O Benfica não é só campeão em campo, é também o maior dos campeões por inúmeras atitudes como estas. Ser do Benfica é ser campeão na vida! “

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

A Destreza das Dúvidas: 2,1%

"Desde 2001, a última vez que Portugal cresceu acima de 2% foi em 2007, com uma taxa de 2,49%. No ano a seguir, cresceu a 0,2%, e depois em 2009 a -2,98%. As políticas actuais de crescimento do governo não são muito diferentes das anteriores, apenas não se irá gastar tanto em obras públicas. Reduzir os impostos, repôr salários públicos, aumentar o salário mínimo, etc., são choques que têm maior impacto no primeiro ano; em anos subsequentes, não têm impacto quase nenhum, ou seja, não são políticas de crescimento sustentável. São políticas que se utilizam para estimular a economia quando há uma recessão que não tem causas estruturais. Note-se que, no caso de Portugal, o aumento do salário mínimo até pode ser uma política de empobrecimento a médio e longo prazos."


A Destreza das Dúvidas: 2,1%: O nosso ilustre Ministro das Finanças reduziu a estimativa da taxa de crescimento da economia portuguesa para 2016. Supostamente, irá cresce...

(tela de Abel Manta)

domingo, 3 de janeiro de 2016

Produzir ou redistribuir?

         "Sem o medo dos socialistas e da revolução, Bismark nunca teria posto em prática as suas leis sociais. O movimento operário desempenhou, portanto, um papel essencial na formação progressiva de uma classe média com condições de vida decentes. No entanto, essas lutas teriam dado em nada na falta de um crescimento da produção desde há mais de um século, que tornou possível a distribuição. A oferta mantém-se em primeiro lugar; toda a história das origens da Revolução Industrial mostra a importância das trocas, das instituições e da liberdade económica. Nenhuma revolta dos escravos romanos nem nenhuma insurreição dos servos da Idade Média permitiram pôr fim à miséria, muito simplesmente porque não havia nada para repartir, pois nem a pilhagem da riqueza das classes favorecidas, justificada por uma pobreza extrema e por uma exploração feroz, permitiam melhorar o destino dos pobres. É preciso começar por aumentar a produção antes de reparti-la equitativamente e, para aumentar a produção, são necessários incentivos económicos e um sistema de regulação da oferta e da procura que são fornecidas pelo mercado e pelas empresas privadas." (Jacques Brasseul, História Económica do Mundo)

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

O dia D do futebol nacional

      Aconteceu quando o Benfica recusou a oferta de 23 ME anuais da Olivedesportos para a renovação do seu contrato de direitos televisivos, contra os miseráveis 7,5 ME anuais do contrato anterior "concedido" graças à situação de penúria financeira em  que se encontrava por essa época. Esta constituiu a base da  "fórmula mágica" que esteve na origem da prosperidade económica  das empresas de Joaquim Oliveira e que assegurou o domínio desportivo do FCP durante décadas.

   A condição de exclusividade em que aquele tinha acesso ao direitos televisivos dos clubes, proporcionou-lhe acesso a capital e, através deste, ao poder "normativo" formal e informal que dominou o futebol em favor do FCP. Ano após ano assistimos a espetáculos desportivos deprimentes com contornos de prepotência e hipocrisia que tem dominada a sociedade portuguesa. De facto, esta penosa realidade beneficiou da cumplicidade político-partidária que Pinto da Costa geriu com mestria graças à densidade demográfica a norte, decisiva nos resultados eleitorais.
 
   Filipe Vieira, contra todas as incertezas, deu sequência ao apelo dos adeptos e avançou com o canal do Benfica, que, rapidamente, se transformou num sucesso económico e social, provocando uma hemorragia fatal para a Sport TV, salva, recentemente, pelos "cúmplices" do costume; BCP, BES, operadoras nacionais por cabo e uma valente bateria de "playeres"; desde investidores angolanos a "gurus" da economia nacional afetos ao FCP e a facilitadores institucionais de relevo. 

   Por todas estas razões trata-se de uma organização que deve continuar a suscitar reserva por parte dos dirigentes do Benfica, aconselhando toda a prudência, em particular na duração dos contratos. Nas recentes negociações, a valia dos direitos de transmissão da BTV ficou bem patente, equivalendo-se aos outros direitos que SCP e FCP venderam, nomeadamente, a publicidade nas camisolas e no estádio, algo que, no clube encarnado, grosso modo, valerá 20 ME ao ano.
 
   À parte o caso Vale e Azevedo - que, para mim, não tem perdão -, e os fundadores dos grandes clubes, Filipe Vieira é, quanto a mim, o melhor dirigente desportivo nacional de sempre; pelos projetos que desenvolve no Benfica e, sobretudo, por ter "desmantelado" - até ver - a poderosa teia que manteve os clubes reféns dos interesses do FCP durante longas décadas, criando as condições para uma nova era no futebol nacional, baseada na autodeterminação económica e funcional dos clubes e na independência das instituições que tutelam o desporto nacional.
 
   Todos beneficiarão, direta e indiretamente, mas tal não significa que, muitos, não voltem a cair em novas armadilhas suscitadas pela implacável tabela classificativa e de quem a controla, bem como pelo "criminoso" quadro competitivo das provas da UEFA e modelo de distribuição pelos clubes e federações das mais-valias das respetivas competições. Três "galos" para dois poleiros europeus é a fórmula que corrói o futebol nacional, impondo-se a reformulação de todo o modelo.
 
   PS: Alguns dos "pequenos" clubes parecem apavorados, como se percebeu recentemente pelas declarações de  Manuel Machado no final do Benfica-Nacional para a Taça da Liga.  Mas não têm que se preocupar; todos receberão mais dinheiro e têm, agora, por onde escolher - além das duas operadoras nacionais, parece que surgiram algumas estrangeiras. No entanto, o bolo poderia ser bem maior se a vaidadezinha e a covardia de alguns, não os tivesse conduzido ao atraiçoamento de Mário Figueiredo cujo projeto era o que melhor servia os interesses de todos; centralização dos direitos televisivos, fim à exclusividade da Olivedesportos e aumento da competitividade dos jogos através da alteração dos modelos competitivos dos campeonatos. Alguns teriam que ficar de fora e outros não chegariam aos jogos com os "grandes". Foi aqui que se deu a rotura, precipitada pela asfixia financeira proporcionada pelos habituais patrocinadores  - até da Santa Casa da Misericórdia! -, pela FPF, e...pela Autoridade da Concorrência, que "congelou" a resposta à "participação" de Mário Figueiredo contra a Olivedesportos, até estar consumado o seu afastamento à frente dos destinos da Liga. O meu tributo a Mário Figueiredo, que revelou lucidez e extrema coragem em todo o seu mandato, por ter enfrentado os poderes que todos temiam. Diga-se, finalmente, que dispunha do apoio discreto, não explícito, do Benfica, que se disponibilizou para a solução da concentração dos direitos. Mas...tal não convinha aos interesses do FCP e do SCP, que acabaram por colocar no seu lugar "o espantalho"  do Proença, apesar dos danos que a sua passagem pelos relvados nacionais provocou.