Desporto

sábado, 3 de novembro de 2018

O desastre de ontem

O futebol miserável que a equipa do Benfica apresentou ontem frente ao Moreirense vem desde a pré-época da temporada passada e é, nem mais nem menos, do que o corolário dos equívocos do seu Presidente; na relativização dos objetivos de curto-prazo - conquistar títulos no futebol sénior - em favor dos de longo prazo - a conquista da Liga dos Campeões - e na incapacidade de perceber os requisitos necessários do líder técnico do projeto, o Treinador Principal. Não bastam as qualificações ao nível da formação nem a capacidade de apostar nos jovens talentos; sem capacidade competitiva de topo todo o projeto sairá desvalorizado e ruirá como um castelo de cartas. O atual Treinador do Benfica tem excelentes qualidades humanas, não tem medo de arriscar e é até um bom Treinador mas não ao nível das aspirações do clube. Quando um Treinador do Benfica diz, publicamente ou em privado que, temos que aprender a viver com o insucesso,  só tem um caminho a trilhar; o da porta de saída. O Benfica é o oposto; o inconformismo com a derrota, a indomável vontade de vencer.
 
   Não é necessário ser especialista para perceber os princípios gerais do futebol e avaliar, grosso modo, a qualidade de jogo de uma equipa. O fascínio do futebol passa por aí. Ora sucede que o atual futebol do Benfica revela lacunas táticas gravíssimas, desde a pré-época da temporada anterior, cujo resultado se traduziu num vexame sem precedentes do qual destaco a derrota por 5-0 com o modesto Basileia. Se, num primeiro tempo poderíamos atribuir tal desempenho ao tremendo rombo infligido no plantel  pela Direção do clube - por imposição dos bancos, julgo eu -, nem depois, quando a equipa recuperou alguma capacidade competitiva animando um campeonato destinado aos azuis, nem atualmente, com um plantel melhor apetrechado para a cómica Reconquista, perante a persistência das lacunas, encontramos outra explicação que não seja a incapacidade do treinador.
 
   A equipa não revela coesão tática; desagrega-se com o andamento do jogo e vive da inspiração individual dos jogadores, de algumas combinações - poucas - que conseguem fazer e da menor qualidade dos adversários.  Comprova-se isso observando a deficiente ocupação do terreno de que resulta grandes lacunas entre jogadores e a ausência do designado "fio de jogo"; geralmente escasseiam linhas de passe ao portador da bola que, para as obter, despende grande esforço físico, acumulando fadiga e perdendo, gradualmente, capacidade competitiva, enquanto os companheiros geralmente permanecem, pateticamente, estáticos em zonas neutras, aguardando o endossamento da bola. Então vão-na trocando transversalmente a baixa velocidade até perderem a posse, sem sequer tentarem o remate à baliza ou algum passe de rotura, ou nalguma tentativa de penetração no bloco contrário. Falta dinâmica, sincronismo coletivo, capacidade criativa, verticalidade, velocidade e intensidade. E falta meia-distância, jogo aéreo e centros e cruzamentos com qualidade.
 
   Na fase defensiva, os jogadores não sabem que terreno ocupar; limitam-se a correr atrás da bola, como tontos, e a recuar desordenadamente para a zona da grande-área abrindo zonas de tiro ao adversário; pressionar o portador, fechar linhas de passe e fazer marcações com eficácia não consta do cardápio tático da equipa.
 
   É demasiado pouco . 
 
   O Presidente do Benfica está tão obcecado com  a formação que está disposto a sacrificar o essencial, ganhar! E na tão afamada estrutura profissionalizada, principescamente paga, ninguém percebe o decadente e ruinoso estado da arte da equipa sénior de futebol? Claro que sim, mas temem perder o lugarzinho. Atualmente não há espaço para a dissidência interna. A BTV de hoje, é deprimente; transformou-se numa feira de amanuenses embevecidos com a visibilidade pública. Vivem a ditadura parola do messianismo imposta pelo atual Presidente. Quer este, quer os restantes membros do Conselho de Administração - entre os quais, surpreendentemente, o ídolo dos benfiquistas Rui Costa -, quer o atual Treinador, vivem em negação, ignorando que não é por acelerar a fundo que um fia se transforma num ferrari. Não é por muito querer que um bom treinador se transforma num treinador de topo. É o caso.
 
   Ao querer proteger Rui Vitória, Filipe Vieira, provocou o contrário, sujeitando-o a uma inevitável saída humilhante e ao clube, a mais um vexame. Fica assim demonstrada a incapacidade do atual corpo diretivo numa área vital. O Benfica necessita de um novo fôlego. Um fôlego destituído de patéticos messias, recentrando o clube no essencial; nas vitórias, e não em projetos de hotelaria, na construção civil, no ensino, ou outros; na defesa do clube perante as ameaças externas que, farisaicamente, se abatem sobre si. Enfim, um clube à imagem do  famigerado quarto anel; sem medo nem rabos de palha.

PS: Com que motivação entraram em campo os jogadores de origem externa depois de o Presidente do clube, no êxtase das comemorações do Estádio, ter afirmado que só com jogadores formados internamente o Benfica poderia almejar ao título europeu? Uma imprudência idiota de consequências imprevisíveis mas seguramente nefastas.
 
Foto: Rua Peniche de cima
 
Peniche, 3 de Novembro de 2018
António J. R. Barreto