Desporto

domingo, 25 de novembro de 2018

Momento do Benfica V: O carrossel financeiro


 
Vale e Azevedo deixou o Benfica sem dinheiro, mas com um passivo marginal - da ordem dos dois milhões de contos (10 milhões de euros) - e com projetos: a constituição da SAD - com 20 milhões de contos (100 milhões de euros) -, a recuperação do estádio antigo - projeto de Tomaz Taveira cujo custo estava orçamentado em 4 milhões de contos (50 milhões de euros) -, o complexo do Seixal - adquirido à Euroárea por 1 milhão de contos ( 5 milhões de euros) - e um contencioso jurídico contra a Olivedesportos, com grandes possibilidades de êxito.
 
   A estratégia de Filipe Vieira de construção de novas infraestruturas teve como contrapartida um endividamento "estratosférico" e a perda da capacidade competitiva do "core business" do clube; o futebol da sua equipa sénior A. Primeiro pela necessidade de canalizar recursos para as obras, depois, pelos elevados encargos do financiamento e esforço de amortização do capital.
 
   Face a esta contingência, a Direção de Filipe Vieira, criou um fundo de investimento que permitiu ao clube - SAD - aceder, no mercado, a jogadores de elevado potencial e a mantê-los na equipa durante dois ou três anos, gerindo a venda ou recompra de direitos económicos de jogadores ao fundo, conforme as circunstâncias. Esta fórmula possibilitava a continuidade do núcleo da equipa, e, consequentemente, a ascensão da capacidade competitiva. Controladamente, ressarciam-se os investidores e o clube dispunha de almofada financeira para responder às necessidades de tesouraria.
 
   Por decisão da FIFA, estes fundos foram proibidos a partir de 1 de Maio de 2015, com justificação na suspeita de que estariam a ser usados para lavagem de dinheiro. Um "murro no estômago" que ia levando o Benfica ao "tapete". Foi então que se deu o primeiro "milagre" do projeto da formação; vários dos talentos emergentes foram colocados no mercado europeu por generosas verbas - qual terá sido a intervenção de Jorge Mendes no caso? Bernardo Silva, João Cancelo, Ivan Cavaleiro, Hélder Costa e mais um ou dois que não recordo, proporcionaram ao clube (SAD) os ingressos financeiros necessários à resolução do fundo sem recurso ao endividamento bancário. "Just in Time"!
 
   Pessoalmente, acredito que a motivação da FIFA tenha sido outra; a de proteger da concorrência os grandes clubes, garantindo-lhes acesso facilitado aos melhores jogadores, à competitividade desportiva e a maior fatia do bolo financeiro da indústria do futebol. Nunca me constou que, quer a FIFA ou mesmo a UEFA, tivessem qualquer tipo de escrúpulos quanto à origem do dinheiro que as financia. Os exemplos são bastos.
 
   Avisadamente, dada a turbulência do sistema bancário, geralmente inamistoso para o Benfica e generoso para os seus rivais -  os dirigentes encarnados, paulatinamente, trataram de  dispersar o financiamento do clube (SAD), recorrendo a sucessivos empréstimos obrigacionistas, realizados sempre com grande sucesso em rotação de capital e com encargos sucessivamente decrescentes, que se mantém.
 
   Na época transata, com o campeonato já a pender para Norte, a Direção do Benfica acordou a antecipação da receita de três anos - salvo o erro -, com que liquidou cerca de cem milhões de euros de passivo bancário, recorrendo ao serviço de factoring que custou cerca de 16 milhões de euros - precisamente o valor remanescente do passivo bancário.  
 
   A justificação foi a da redução do serviço anual da dívida antecipando a amortização do respetivo capital. Francamente, tenho a convicção que foi mais do interesse dos bancos, uma vez que, se o Benfica poupa cerca de 16 milhões de euros por ano em juros, priva-se da receita de 40 milhões durante três anos. Ora, tal implica, perda de capacidade competitiva. Como é que isso pode ser do interesse do Benfica? Mas é verdade que proporciona algum conforto aos adeptos. Porém, não deixa de ser estranho que, tendo obtido uma receita recorde de 240 milhões de euros na venda de jogadores, tenha sido necessário recorrer à antecipação de receita para efetuar a operação referida. Provavelmente os ganhos líquidos do clube terão sido bem menores e parte deles terão sido alocados à despesa corrente. Tal significa que o modelo económico de então não tem viabilidade para a consecução do Benfica campeão europeu. E é esta a fundamentação da indiscutibilidade da opção pela formação. E, já agora, a justificação da opção Rui Vitória; o suposto "mago" da formação. Sucede porém que, sem uma equipa competitiva, o projeto da formação é inviável. E tal requer competências que Rui Vitória não demonstra possuir.
 
   O custo desportivo desta operação foi a perda de mais um campeonato. Tal terá sido também do interesse dos sindicato bancários - minha convicção - habitualmente hostis para com o Benfica, desde os tempos de Vale e Azevedo.
 
   Ultrapassado mais este obstáculo, com o Benfica livre dos bancos e a formação a debitar fornadas de jogadores valiosos, surgem os casos dos "vouchers", dos "e-mails", e das "toupeiras", supostamente induzidos, em desespero de causa, pelos rivais, restaurando uma velha e iníqua aliança denunciada em tempos pelo senhor João Rocha. Os objetivos são claros; redução da capacidade competitiva da equipa pela indução de instabilidade geral no clube (SAD), manchar a sua reputação associando-o a corruptela e, mais grave, desacreditar o clube junto do mercado obrigacionista cerceando-lhe o financiamento.
 
   Este é momento de, mais uma vez, recordar que a perda de Vale e Azevedo iniciou-se com o congelamento das contas bancárias do clube pelos mesmos bancos que têm derramado dinheiro sobre os rivais e que no ano passado parece terem exigido a amortização de capital ao Benfica, que o fez perder mais um campeonato.
 
   Claro que os processos que correm na justiça contra pessoas com ligações ao Benfica - minha convicção - vão arrastar-se durante toda a época fazendo pairar um permanente suspense sobre o seu desfecho até que o campeonato em curso esteja, finalmente, decidido em conformidade com os desígnios da "radiosa" democracia de abril. Muitos são os indícios de promiscuidade na Justiça, com sucessivos casos  de transparência duvidosa. Há adeptos de clubes, cuja militância não conhece fronteiras, independentemente, das funções e cargos que ocupem. São aqueles cujos clubes se constituíram em frente política das elites onde estão inseridos. Refiro-me ao Porto, sim.
 
  
   Se nem os organismos desportivos, nem a tutela governamental, nem a Justiça, são imunes à natureza política de alguns clubes de futebol, é tempo de o Benfica usar, com inteligência, a força dos seus adeptos, lavando-os a votar em conformidade com os projetos para o desporto, dos candidatos políticos.
 
   Filipe Vieira não o sabe fazer.
 
Foto: Falésias de Porto Novo
 
Peniche, 25 de Novembro de 2018
António J R. Barreto

O 25 de Abril visto da História (notas, P12)



O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais
 
…os processos conspirativos de tomada do poder ou a atividade política como atividade conspirativa como atividade política dominante são característicos de países em que o peso do Estado é preponderante face à debilidade da sociedade civil. (VJS)

   Quarenta e quatro anos depois do fim da “longa noite fascista” o Estado foi tomado pelos Partidos, que mantêm a sociedade civil em estado “vegetativo”, esta, subsistindo perante a voracidade fiscal e patrimonial dos novos “senhores” - herdeiros dos velhos privilégios da extinta nobreza e do esclerosado clero. (AB)

…Em segundo lugar, temos a natureza tipicamente pequeno-burguesa do Movimento dos Capitães, que o expôs, necessariamente, às mais diversas e contraditórias flutuações, culminando, por fim, na desintegração do MFA…(VJS)

   O MFA refletia as contradições da sociedade civil, de onde, afinal, provinham os seus membros. Por essa altura, uma sociedade “partida ao meio”, correspondendo quase completamente a duas zonas geográficas distintas, com duas histórias de povoamento distintas e com padrões económicos distintos. Até hoje, o 25 de Abril deixou um país fraturado, economicamente indigente. (AB)

…Disso se apercebe claramente o PS, ao tomar a dianteira da ofensiva contra o gonçalvismo e ao capitalizar em proveito próprio toda essa vaga imensa de frustrações explosivamente acumuladas…(VJS)

Pensava-se então que o socialismo do PS não tinha correspondência com a doutrina marxista, muito menos com o modelo leninista que o PCP estava a levar ao terreno, numa vaga de terror de sentido contrário ao “fascismo” antecedente. A realidade de hoje confirma tese de muitos de então - como Rui Mateus -, segundo a qual, estaria em causa, não o marxismo-leninismo do PCP, mas a liderança do processo. E o gradualismo reformista  do mesmo, digo eu; para não assustar os eleitores. (AB)

….A estrutura hierárquica do partido corresponde organicamente à estrutura hierárquica do exército: daí à osmose vai um passo. E daí que seja uma explicação moralista primária o dizer-se que certos oficiais, bem conhecidos pelas funções destacadas que desempenharam no decurso da guerra colonial, se converteram por mero oportunismo em instrumento do PCP ou da extrema-esquerda. O que acontece é que, face à crise de identidade em que o exército de debate com o fim das guerras coloniais, as únicas alternativas ideológicas que então se apresentam para preencher o vazio são as do PCP e de certa extrema-esquerda. (VJS)

   VJS não refere casos pessoais, mas talvez Costa Gomes tenha sido um desses casos, quanto aos mais conhecidos; Melo Antunes, Rosa Coutinho, Vitor Crespo…,tenho ideia que terão sido opções ideológicas muito anteriores ao 25/04. (AB)
Foto: Marginal Norte
Peniche, 17 de Novembro de 2018
António J.R..Barreto

O 25 de Abril visto da História (notas P 11)



…Esta situação, o 11 de Março, atingiria o seu ponto mais alto. Aí, ao tomar, praticamente sozinho, o controlo da máquina do Estado, o Partido Comunista assinava a sua própria sentença de morte, a médio prazo, como partido de governo…. (JAS)

   Mas ficou a semente. Até hoje. E foi o suficiente para entregarem as províncias ultramarinas à União Soviética.(AB)

…O Partido Socialista começa, diretamente, através do seu secretário-geral Mário Soares, por desempenhar um papel preponderante na descolonização, é depois ultrapassado e acaba – claramente já marginalizado – a condenar de modo explícito a forma como decorria a evolução dos acontecimentos em Angola e a posição da parte portuguesa….(JAS)

   Pelos vistos estava errado ao considerar que o Partido Socialista e Mário Soares dominaram o processo da descolonização. (AB)

…Recorde-se que, é em torno de África, a propósito do ultimato inglês, que a propaganda republicana mobiliza a opinião pública contra a Monarquia e o Partido Republicano ganha expressão nacional….(JAS)

   Uma ironia, perante a invocada herança republicana dos atuais socialistas; o conceito de integridade do território mudou. E o povo, preocupado em sobreviver, aceita o que lhe “dão”. (AB)

…Costa Gomes foi secretário de Estado de Salazar – posto de que foi demitido pelo seu envolvimento na conspiração abortada de Botelho Moniz -, foi comandante-chefe das Forças Armadas em Angola; foi Chefe de Estado Maior das Forças Armadas ao tempo de Caetano; foi demitido do cargo pouco antes do 25 de Abril e recuperou-o após o 25 de Abril; foi Presidente da República, sucedendo a Spínola….(JAS)

   É obra!, consta que foi preponderante no desfecho do 25/11/2018. (AB)

….É impossível pensar, por exemplo, que a URSS se tenha disposto a intervir de modo tão claro em Angola sem dispor de garantias antecipadas de que os Estados Unidos não se iriam opor frontalmente a essa intervenção….(JAS)

    Em plena Guerra Fria, aquelas duas potências repartiram o mundo conforme os seus interesses. Estava em causa o acesso direto aos recursos dos territórios administrados por Portugal. Mais que os direitos humanos ou o direito dos povos à autodeterminação. A prova disso é a atual olímpica indiferença da comunidade internacional perante as oligarquias instaladas nesses países e o estado de profunda miséria em que os respetivos povos vivem. (AB)

…Spínola não esconde a sua exasperação progressiva, o seu desespero, a sua impotência, traduzido num discurso cujas conotações fascistas (nomeadamente no Alfeite e em Tancos) são cada vez mais claras. Ao mesmo tempo que assina o reconhecimento do direito à independência dos povos colonizados, Spínola evoca as “sagradas parcelas” do “nosso ultramar” e transfere para a “Mãe-Pátria” as razões de ser da luta desencadeada pelo Exército português contra os povos das colónias: “Responderemos com a guerra aos que nos quiserem fazer a guerra”.

   Spínola, derrotado na Guiné na sequência da perda da supremacia aérea para o PAIGC – graças ao apoio militar da URSS e de Cuba -, perante a intransigência de Marcelo na recusa de entabular negociações com o inimigo, deixou-se perder pela sua vaidade e contradições, aceitando o penacho da presidência acreditando, ingenuamente, que os restantes protagonistas do golpe de estado aceitariam a sua liderança na condução das negociações com os movimentos de libertação. Melo Antunes e Otelo, irresponsavelmente ou premeditadamente, assumiram, perante os negociadores africanos, por parte do Estado português, responsabilidades para as quais não tinham mandato. (AB)
Foto: Peniche, Porto de Pesca
Peniche, 16 de Novembro de 2018
António J. R. Barreto