Não há campeões sem mérito, é certo. É o
caso do Sporting 2020/2021, por ironia, um clube cujos dirigentes têm sido
incapazes de reconhecer o mérito aos adversários quando estes ganham, em
especial ao Benfica. Mas é verdade, técnicos e Dirigentes do clube verde-branco,
pacientemente, em devido tempo, procederam à reestruturação cirúrgica do
plantel, que, sem nomes sonantes, haveria de revelar-se eficaz.
Dos lados da luz, de cofres a abarrotar, ouvia-se o desdenhoso canto das
“cigarras”; o regresso de Jorge Jesus, consagrado pelos feitos desportivos
realizados no Brasil, juntamente com os novos reforços, alimentavam a esperança
em gordos sucessos. Sucessos que, um a um se foram escapando até não restar
nenhum! E não só por causas externas. Numa época atípica, sem memória na história
do futebol, cheia de peripécias e anormalidades, apesar dos inusitados cem
milhões de euros investidos - uma “barbaridade” - o plantel do Benfica revelou-se,
surpreendentemente fragilizado em várias posições. A outrora competente
estrutura transformou-se, afinal, numa vulgar feira de vaidades.
Porém, se é de justiça reconhecer mérito às hostes sportinguistas,
também é forçoso identificar o contributo de fatores excecionais
extradesportivos. Um deles foi o fator Alcochete, outro o Bancário e ainda
outro de caris político-institucional.
Bruno de Carvalho foi um dos grandes obreiros do atual sucesso do
Sporting; a tremenda turbulência que a sua gestão induziu, internamente e em
todas as esferas do futebol e até bancárias e judiciais, culminou com o inédito
episódio de violência de Alcochete. A sua absolvição lançou o pânico no meio
sportinguista e do futebol em geral. Nestas circunstâncias, só a vitória no
campeonato o manteria afastado da liderança do clube de Alvalade. Foi o que
ocorreu.
No plano económico é sabido que o popular clube verde-branco há muito se
encontra tecnicamente falido, vivendo de emissões obrigacionistas e sucessivas
reestruturações e perdões de dívida, um modelo insustentável em condições
normais, quanto mais num período de forte instabilidade bancária e económica.
Falhada a liquidação do empréstimo obrigacionista em 2019, só um salto
enfrente, a participação na Liga dos Campeões, poderia garantir o acesso a
novos fontes de recursos e ao reequilíbrio financeiro do clube-SAD. Foi o que
ocorreu.
Quanto ao fator político-institucional, recordo uma declaração pública
de alguém, segundo a qual seria um desígnio nacional salvar o Sporting. Algo
que compreendo mas que me custa a aceitar, antes de mais porque, por várias
vezes, dirigentes sportinguistas tudo fizeram para acabar com o Benfica. Por
outro lado as competições desportivas não devem ser desvirtuadas para salvar
seja que clube for, Sporting Clube de Portugal incluído. Está em marcha.
Terão estes fatores tido algum efeito no desfecho do campeonato
2020/2021? Não sei. Mas não afasto completamente essa possibilidade.
Finalmente, o estado financeiramente deficitário da generalidade dos
clubes portugueses - exceção ao Benfica, por enquanto - reflete a falência do
atual quadro competitivo do futebol na Europa onde até os chamados “tubarões” estão
em graves dificuldades, como o demonstra a recente tentativa da criação da
Superliga Europeia. União Europeia e UEFA devem rever todo o modelo
competitivo, desde o financiamento à regulamentação económica dos clubes.
André Lhote
Peniche, 5 de Junho de 2021
António Barreto
Sem comentários:
Enviar um comentário