O 25 de Abril Visto
da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José
António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em
vésperas as primeiras eleições presidenciais
…E esse é um traço característico
do atraso português, uma constante da nossa história dos últimos cento e
cinquenta anos. Durante o liberalismo, durante a República, e também durante o
Estado Novo e ainda depois do 25 de Abril, os quadros políticos dirigentes são
recrutados em grande parte - e até em maioria relativa - entre elementos das
profissões liberais, entre advogados…. (VJS)
António J. R. Barreto
…A necessidade de legislar surge,
no fundo, de certo modo, como alternativa à incapacidade de transformar…..(JAS)
Começo a duvidar da utilidade dos
intelectuais na vida política dos povos. (AB)
…A Inglaterra…fazendo no fundo as
vezes de uma “burguesia dominante” que nunca apareceu em Portugal. De França
importava-se a ideologia da Revolução….não apenas a mentalidade, o estilo, o
discurso político, o radicalismo verbal, o anticlericalismo radical, mas mesmo
as organizações revolucionárias (como é o caso da Maçonaria e da Carbonária),
importava-se o jacobinismo – que haveria de ter um papel decisivo na
implantação da República em Portugal. (JAS)
Inglaterra e França encontra-se hoje ensarilhados nas teias das suas
próprias contradições face ao fenómeno da imigração, e Portugal parece apostado
em seguir-lhes as pisadas, aprofundando os seus equívocos e a coesão social.
(AB)
…Ao longo dos últimos dois
séculos, a sociedade portuguesa, vive permanentemente entre dois impulsos: um
de natureza exterior, que se faz de fora para dentro e de cima para baixo, e
que é de sinal desenvolvimentista, transformador, que caminha no sentido da
implantação de relações capitalistas; ou outro, de natureza interior, que se
verifica de dentro para fora e de baixo para cima, que se faz no sentido da
preservação das relações tradicionais contra a tendência invasora da ordem
capitalista. (JAS)
Isto passa-se em qualquer sociedade minimamente aberta, não é exclusivo
de Portugal, e é bem mais complexo; o caso da Inglaterra no século XIX ou dos
USA no século XX são exemplos dos poucos países que mudaram as suas estruturas
económicas a partir de dentro. A ameaça castelhana induziu Portugal à
dependência militar externa - da
Inglaterra; a conjugação destes dois fatores aliado à implacável perseguição
dos Jesuítas pelo Marquês de Pombal - fechando-lhes as escolas – e à atuação da
Ordem do Santo Ofício - que só viria a ser formalmente extinta em 1842 -,
talvez ajude a explicar a fraca dinâmica transformadora a que JAS alude e que
parece perpetuar-se. Hoje, assistimos a uma transformação estrutural da
economia portuguesa, imposta pela União Europeia, com recurso a subterfúgios
como o do aquecimento global, do ambiente, ou da produtividade, sem que se
perceba bem quem são os efetivos beneficiários desta transformação. (AB)
…Ora…a pequena burguesia
constitui uma manta de retalhos…e não pode segregar, de facto, o que Gramsci
chama “os intelectuais orgânicos” de uma classe, os partidos. Daí que os
partidos surjam em Portugal como fatos que, depois de acabados no alfaiate,
partem à procura do corpo social. (JAS)
Talvez esta seja uma das causas do fechamento dos partidos portugueses
à sociedade, devido ao medo de perderem as suas referências doutrinárias, e da
distorção da democracia devido ao empenho partidário na mudança dos cidadãos e,
absurdamente, na substituição da população, para sustentação dos seus projetos
de poder.
Foto Praia de Peniche de cima
Peniche, 01 de Novembro de 2018António J. R. Barreto
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