1º Ato:
As famílias comemoravam, no local
da boda, o aniversário do casório dos seus rebentos. Pelo canto do olho, ia observando o andamento do jogo do Benfica
com, não sei que clube, para o campeonato. - Têm-se feito grandes progressos no futebol do Benfica. Disse
eu, dando alguns exemplos. - Ah!, mas ainda há muito por fazer, a equipa ainda
não funciona bem…os gajos lá de cima estão muito fortes…eu…sou Benfiquista mas
sei ver as coisas…
2º Ato:
Abri a
porta do gabinete, com vista para o mar, do Mário, onde ia tratar de negócios. -
Bom dia, está bom? - Tudo bem e você?. -Também; o benfas ganhou, que se lixe o
resto. Retorqui satisfeito, enquanto puxava de uma cadeira. - Pois…eu…sou...Benfiquista, mas…não sou assim…doente!,
aqueles gajos lá de cima não têm vergonha!
3º Ato:
- Já sabia que estavas aqui
Jorge. Disse, ao entrar com o júnior no café dos círios onde diariamente
tomamos a bica do almoço, ao vê-lo apoiado no balcão tagarelando com o João.
- O cheiro a suor, nota-se ao longe!, só podias ser tu! Gracejei,
aludindo à sua tradicional descontração, puxando o jornal da mesa do lado e perguntando
num fole, divertido, ao amigo João, que já tirava as bicas da velha máquina. -
Então Sr João, morreram muitos? - Acho que não. Respondeu, com as bicas
fumegantes em nossa direção e um sorriso cúmplice. - Gostou do Jogo?
Perguntei-lhe. - É pá!, grande frango deu o Artur! Respondeu de imediato o
Jorge. Com o à vontade que a nossa amizade permite retorqui de imediato: - é
pá és mesmo um Benfiquista rasteirinho, pequenino…então, com tanta coisa boa
que aconteceu no jogo, o que te ocorre de imediato, é o frango do Artur? - É pá, sou Benfiquista mas sei ver
o que está mal…não é só as coisas boas! Respondeu o Jorge, continuando: -
Rasteirinho…pois…já sei…resmungou entredentes, dirigindo-se
apressadamente à saída. Desatámos a rir. Eu, o júnior, o Jorge e o João,
somos Benfiquistas.
O Jogo em causa era o
Estoril-Benfica realizado na noite de sábado - 5.01.2013 -, onde a equipa do
meu clube marcou três tentos de alto gabarito para gáudio dos amantes de
futebol, com destaque para o do Gaitan, graças
a um gesto técnico que nunca vi fazer a quem quer que seja nem de tal coisa ouvi falar!
Conclusão:
Não sei quando começou nem sei
bem porquê, mas há muito que se criou o mito da elevada exigência dos sócios e
adeptos do Benfica. Uma suposta exigência diferente da dos adeptos dos outros
clubes, por ser mais esclarecida e menos tolerante, baseado no pressuposto da
sua alegada maior cultura desportiva, maior capacidade auto-crítica e de confronto sem concessões; seja relativa ao jogo,
ou à gestão do clube. Esta teoria tem que se lhe
diga e, em geral, não acredito nela, hoje mais convicto que ontem.
O que é certo é que esta
“doutrina” fez escola entre os Benfiquistas. De tal modo que, Benfiquista que se preze, seja onde
for, trata de explanar a sua superioridade de adepto, começando por,
doutamente, dizer mal do seu clube, justificando os insucessos com erros próprios,
pondo-se assim a coberto da dialética de confronto com adeptos
adversários, cujos clubes, frequentemente, acabarão por elogiar, relativizando as
mais grotescas e despudoradas trafulhices que não poucas vezes estes praticam ou
promovem.
Ou seja; fazendo passar a mensagem do “deixem-me em
paz, pois até acho que têm razão”. Em suma, entendo que, na maior parte dos
casos, se trata de seguidismo amarelo. Lembra-me aquele pai que, assistindo à
derrota do filho vítima de adversidade ou artimanhas várias,
despeitado, em vez de o acarinhar e incentivar, o envergonha e humilha!
Esqueceram a primordial razão que
esteve na origem da constituição do clube; o prazer da prática desportiva, a
solidariedade, a amizade, a competência, a lealdade e a união. A frase que, no emblema, apela à união, não está lá por acaso. Os fundadores do Benfica sabiam
que era condição necessária para a construção de um grande clube tal como o
idealizaram. A história dos sucessos do Benfica tem este vínculo! Vínculo que,
em boa parte, se perdeu devido a esta deriva da cultura desportiva em que o “espírito
de grupo” deu lugar à crítica compulsiva, sectária e, muitas vezes, acéfala, com a
justificação da "falsa" exigência como condição para o progresso desportivo.
Não é
possível criticar consequentemente sem considerar o universo envolvente;
entendê-lo, compreender as suas âncoras e as suas dinâmicas. É neste contexto
que deve ser feita a análise e a crítica interna, num clima de cordialidade ou
até de crispação, nunca esquecendo que ninguém é dono do Benfica e que nenhuma
entidade progride sem algum tipo de disciplina.
É pois tempo de regressar às
origens, recuperando o espírito fundador, compilando e publicando em modo
acessível, toda a documentação produzida pelos fundadores, testemunhos fiáveis
e acontecimentos emblemáticos, onde a determinação e a solidariedade entre
Benfiquistas foram visíveis. Voltemos a ser,
ET PLURIBUS UNUM
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