Benfica, um novo rumo
O regresso de Jorge
Jesus ao Benfica deveu-se a critérios não desportivos. A forte oposição que se
perfilava para as eleições de 2020 a Filipe Vieira impunha uma aposta
mobilizadora dos sócios. A popularidade do antigo treinador pelos feitos
alcançados no Brasil e o reconhecimento geral da sua valia técnica era garantia
de sucesso. O lote de supostas estrelas anunciado reforçava a confiança, gerando,
nos adeptos, um estado de euforia pelo futebol “arrasador” que se adivinhava.
Apesar
do animador arranque inicial na época, o fracasso foi total. Uma vaga de
infeções, na sequência do jogo com o rival do Porto, destroçou plantel e
técnicos. Indiferentes, os adversários, alegavam tratar-se de falsa desculpa,
recusando-se, pelo menos no caso de Nacional, a adiar os respetivos jogos. Recorreu-se
aos habituais suplentes, ao juniores e à equipa B. No regresso, os recuperados arrastavam-se
no campo em claro défice físico.
Em
simultâneo, eram anunciadas sucessivas condenações de interdição do estádio,
nada mais nada menos que sete! As multas ao clube e os castigos aos jogadores
prosseguiam ao ritmo pré-pandemia! No terreno de jogo, foram quase totalmente suprimidas
as grandes penalidades favoráveis ao Benfica! Duas grandes penalidades em
trinta e quatro jogos! Pelo menos uma delas no final da época, já com o campeão
decidido! Inexoravelmente, os pontos foram ficando pelo caminho, e o terceiro
lugar foi um quase milagre! Não, não pode ser coincidência! Porto e Sporting tiveram
a favor, respetivamente, dezasseis e oito grandes penalidades! Com o mesmo
critério, apesar de tudo, o Benfica teria sido campeão. As equipas de
arbitragem decidiram o campeonato! A responsabilidade deve ser assacada à Liga
e à Federação.
Entretanto,
na sequência da audição da Comissão de Inquérito Parlamentar aos Grandes
devedores do Novo Banco (NB) e da denúncia pública do sócio Mata-Mouros, o
Presidente do Benfica foi detido, acabando por se demitir do cargo por
manifesta impossibilidade de o exercer. Pela segunda vez na história da
terceira República um Presidente do Benfica é conduzido à cadeia envolto num
labirinto de acusações que promete processos por décadas, tal como sucedeu na
primeira com Vale e Azevedo. Um caso que merece reflexão quando constatamos a
complacência com que outros dirigentes desportivos e outros grandes devedores
do NB têm sido tratados por parte da Comunicação Social e autoridades parlamentares
e judiciais. O Benfica é o “patinho feio do regime. Ou nem isso; é,
simplesmente o “símbolo do salazarismo” que é imperioso abater, impedindo-o de voltar
a ser o que foi no passado longínquo.
Após grande
turbulência e vicissitudes várias, Rui Costa, o “delfim” de Filipe Vieira, com
toda a legitimidade e a autoridade que lhe confere o seu estatuto de grande
benfiquista, assumiu a presidência do clube. Transparência e resultados
desportivos foram as prioridades anunciadas de imediato, mantendo-se contudo os
planos de desenvolvimento de infraestruturas da gestão precedente.
Recuperada
finalmente a equipa do impacto viral, iniciou-se a nova época com renovadas
espectativas, ainda dentro das opções técnicas anteriores, melhoradas com um novo
avançado prometedor, Yaremchuk. O
auspicioso início porém, foi contrariado no primeiro grande embate, pela
derrocada defensiva da equipa ante o rival de Lisboa, o Sporting, agravada
posteriormente pelas pesadas derrotas ante o rival do Porto, na eliminatória da
Taça de Portugal e na jornada do campeonato.
Curiosamente qualquer
dos casos foi antecedido por acontecimentos desestabilizadores do grupo de
trabalho; o episódio do jogo com a B-Sad, essa ópera bufa que me pareceu orquestrada
do exterior, e a investida dos dirigentes do Flamengo na tentativa de contratação
de Jorge Jesus, desviando porventura a sua concentração na preparação do jogo com
o Porto e minando a confiança e motivação dos jogadores. Agravando este
turbulento cenário, o Concelho de Disciplina da Liga tira da gaveta um episódio
da época transata - com cerca de sete meses - salvo o erro -, aplicando um
castigo ao Treinador que o afasta do jogo capital, o do campeonato, que o
Benfica acabou por perder na forma do costume, com muita polémica. A repetição
incessante destes episódios levam-me a considerar o Porto como o Canelas da
primeira divisão.
Apesar de tudo
isto era óbvio que o novo ciclo de Jorge Jesus no Benfica tinha chegado ao fim;
a equipa apresentava desequilíbrios em todos os setores, especialmente nas alas,
com um claro défice na dinâmica de jogo, baixa intensidade, fraca agressividade
e reduzida mobilidade. Com estas características predominando não se ganham
jogos a adversários fortes. A passividade geral dos jogadores mostrava que, na
sua grande maioria, já não acreditavam no projeto do Treinador.
Jorge Jesus,
um dos treinadores atuais que mais sabe de futebol, sem dúvida alguma,
consagrado ao serviço do grande clube do país irmão, o Flamengo, regressou confiante,
algo sobranceiro, desejoso de exibir seu estatuto de grande treinador mundial
ao público português, em especial aos comentadores locais, que habitualmente o
tratam com desdém. Falhou nos, caríssimos, reforços que trouxe, salvo o caso do
Lucas Veríssimo - cuja lesão pôs a nu a fragilidade defensiva da equipa - de
João Mário, um excelente armador, apesar de algo lento, e do Gilberto, que
agora se revela forte candidato a titular. Falhou ao não afastar liminarmente
os dirigentes do Flamengo, alimentando a novela da comunicação social e falhou
nalgumas opções que tomou nos jogos com os rivais, ressuscitando velhos fantasmas,
aparentando falta de energia para inverter a trajetória desportiva da equipa.
Filipe Vieira era o seu vínculo, a sua saída deixou uma semente de desconfiança
com os novos dirigentes. Perante os resultados a sua saída era inevitável.
Os
dirigentes procuram agora um novo rumo, recorrendo no imediato ao treinador da
equipa bê, que tão boa conta tem dado neste escalão, e anunciando uma aposta
mais consistente na formação. Uma estratégia com que concordo, sempre com o
critério da competência como prioridade.
No
plano da equipa técnica, sou um acérrimo defensor do recurso a treinador
estrangeiro assessorado por ex-atleta do clube. Só um técnico estrangeiro
garante imunidade à teia de influências e manipulação interna e capacidade para
denunciar no exterior a miserável gestão do futebol português, onde os
critérios políticos asfixiam a verdade desportiva.
Os
dirigentes do Benfica devem deixar os “punhos de renda” e defender o clube
perante os órgãos próprios, internos e externos, olhos nos olhos,
confrontando-os com a desigualdade de tratamento que têm dispensado ao clube, segregando
desportiva e economicamente as suas equipas, seja na área profissional ou na
amadora; nada escapa ao cerco desportivo montado em torno do Benfica. Devem dar
publicamente um sinal aos adeptos e à classe política da insatisfação pelo
tratamento discriminatório e até persecutório que tem sido dispensado ao clube.
Ninguém! Ninguém, além de nós, adeptos, sócios ou não, defenderá o nosso clube.
A história recente demonstra-o.
Peniche, 9 de Janeiro de 2022
António
Barreto
Sem comentários:
Enviar um comentário