Edgar Morin, filósofo, historiador,
jurista e humanista de 93 anos, francês de origem judaica e crítico da política
israelita, dissidente comunista, ex-combatente pela resistência francesa, autor
de “Diário da Califórnia”, “Um ano de Sísifo” e “Chorar, Amar, Rir e Compreender”,
numa entrevista que concedeu à revista brasileira “filosofia” revelou algumas
das suas ideias e preocupações, entre as quais o cepticismo relativamente ao
futuro da europa e indignação pela passividade desta relativamente aos conflitos
africanos, a predilecção pelo estudo das contradições sociais e humanas, a
dicotomia entre ciência e filosofia e as consequências nefastas da difusão fragmentada
do conhecimento, característica do ensino atual.
E foi esta última faceta que me prendeu a
atenção por estar desde há uns anos sensibilizado para o tema e vê-lo pouco
tratado a tão alto nível. Portugal sofre de um claro défice de difusão e debate
das grandes correntes de pensamento, quando muito acessíveis e aprisionadas
pelas elites académicas, enquanto os meios de comunicação nos entulham a mente
com querelas político-partidárias muitas vezes sem qualquer substância.
A este respeito, refere Morin que o
conhecimento se torna menos interessante se compartimentado em disciplinas,
atribuindo ao alemão Norbert Winer a descoberta da retroação negativa e a utilização da roda da complexidade na definição da grande variedade do sistema.
Crê que a imposição da complexidade sobre a compartimentação caracteriza a época
actual e constitui um novo caminho para o mundo e para o ensino, exigindo uma
mudança da estrutura mental que, segundo ele, está já a ocorrer nalguns países
da América Latina, como o Brasil e em muitas pessoas que aspiram à complexidade
e à posse da verdade. Edgar Morin dedicou grande parte da sua actividade
intelectual de cerca de cinco décadas, traduzida nas obras citadas - uma das
quais constituída por seis volumes escritos em cerca de trinta e cinco anos - a
procurar formas de articulação, de integração dos diversos saberes, sem as
quais afirma não ser possível aspirar à compreensão da realidade, seja das
questões perenes como da vida ou da morte, como para os novos desafios que as
tecnologias e as novas descobertas científicas impõem ao ser humano.
Mais prosaica e modestamente parece-me constituir
a especialização um grave equívoco do atual sistema de ensino enquanto
bloqueador da capacidade de interpretação holística da realidade, traduzindo-se
numa ignorância crónica propiciadora de distorções e contradições com sua
torrente de incomensuráveis consequências. Perante o vertiginoso avanço do
conhecimento, ingrata é a tarefa de Morin e seus seguidores.
Considera o filósofo não existir a
necessária comunicação entre pensamento e Ciência - que reformula a nossa
concepção do mundo - e que esta é incapaz de pensar em si mesma reconhecendo-lhe
a capacidade de produzir os “grãos” mas não a de os “moer”, tarefa própria do
pensamento. Denuncia o absurdo desta compartimentação considerando que a generalidade
dos filósofos estão fechados â Ciência, considerando-a superficial, enquanto os
cientistas desprezam a Filosofia por a entenderem como pura conversa vazia,
apesar de algumas excepções entre as quais a de Michel Cassé.
Uma boa caipirinha é ao que Morin compara
a inteligência quando coquetel bem feito, considerando muito limitadas, quer a
razão sem sensibilidade quer a paixão sem razão. Não diz, porém, a que poderá
comparar-se a criatividade, atributo superior à inteligência mas que dela necessita. Se bem entendo, perante o exemplo de Newton que apresenta, a inteligência
consistirá na capacidade de perguntar e a criatividade na de responder.
Estudioso das contradições humanas, o filósofo exemplifica, recorrendo ao comportamento dos bébés, como o ser humano, sendo profundamente egocêntrico, anseia pelo "nós", pela aproximação dos outros, quando se defronta consigo próprio, quando está só.
Estudioso das contradições humanas, o filósofo exemplifica, recorrendo ao comportamento dos bébés, como o ser humano, sendo profundamente egocêntrico, anseia pelo "nós", pela aproximação dos outros, quando se defronta consigo próprio, quando está só.
Créditos: Revista Filosofia,
edição 78, de janeiro de 2013, editora Escala, com entrevista por Sérgio Mélega.
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