As Comissões de Inquérito Parlamentar são necessárias para aprofundar e analisar assuntos de especial interesse público. Destinam-se a dotar os Grupos Parlamentares de matéria fidedigna para enriquecimento do debate político, elaboração de propostas de lei decorrentes dos casos, bem como identificar e encaminhar eventuais ilícitos para a esfera judicial.
A sucessiva e aparente falta de resultados práticos, ao longo do tempo,
induziu-me a concluir que, em Portugal, o seu préstimo se circunscreve, quase
exclusivamente, a municiar o partido ou partidos de suporte do Governo do
momento, de instrumentos de luta partidária. Outras vezes não passam de
manobras de diversão destinadas a desviar as atenções do público de casos
efetivamente graves da atualidade, potencialmente penalizadores da ação
governativa.
Um exemplo recente: Carlos Moedas foi anunciado candidato à Câmara
Municipal de Lisboa. Pois constou há dias, a propósito de um assunto qualquer
já com barbas e esquecido, a intenção de alguns Deputados da área da Governação
o chamarem a depor numa Comissão de Inquérito Parlamentar nomeada para o
efeito! O caso até pode ter relevância, mas o que parece é que se trata de
antecipação da luta eleitoral com o objetivo de desgastar a imagem pública do
opositor. Indigno!
No caso da Comissão de Inquérito ao Novo Banco em curso, não sei quantas
auditorias foram feitas, sei que várias, mas parece que nunca são suficientes. Desta
vez o propósito, em minha opinião, é duplo; por um lado encontrar bodes
expiatórios para o desastre da operação de venda do banco, e por outro fazer
passar, sem alarido, uma lei de censura digna da que vigorava no Estado Novo.
As vicissitudes que têm vindo a público relacionadas com Deputados;
viagens fantasma, moradas falsas, faltas não registadas, duplo vínculo,
levam-me a duvidar da autoridade moral de muitos Deputados para inquirir
eventuais delitos de terceiros. No caso do Novo Banco, não deixa de ser
caricato que, Deputados do partido do Governo ou dos partidos que o apoiam,
ainda que indiretamente, envolvidos no desastroso contrato da venda do banco à Lone Star, responsabilizem outros, “grandes
devedores”, pelos fracos resultados da gestão do banco.
No caso concreto, atribuir a uma imparidade de cerca de 160 milhões de
euros, salvo o erro, a causa da falência do banco quando o défice acumulado,
por enquanto, é de cerca de 4 mil milhões de euros, é patético.
O tom vexatório, ora jocoso ora intimidatório e agressivo, com que
certos deputados interpelam os envolvidos, destina-se a condená-los e humilha-los
na praça pública, antes mesmo de serem apuradas as respetivas
responsabilidades. Um ato de exibicionismo público indigno de quem detém a
responsabilidade da representação da soberania popular e que viola o direito à
dignidade, constitucionalmente consagrado, de qualquer cidadão, até do Presidente
do Benfica! E, se é verdade que qualquer reestruturação de dívida é
consequência de incumprimento, também é verdade que os respetivos pressupostos
radicam no reconhecimento de causas circunstanciais e da viabilidade económica
do projeto subjacente mediante o desaparecimento de tais causas.
Porém, há uma virtude no atual inquérito; tem suscitado algum
esclarecimento especializado que permite aos “leigos” na matéria, como eu,
tirarem conclusões nada abonatórias para os Governos envolvidos no caso da resolução
do BES e na venda do NB. Por ocasião da resolução do BES, disse-se, com exceção
do PCP, que não traria custos para o contribuinte. Tem! E avultados! Especialmente graves dada a grave
crise que o país atravessa. O ressarcimento, a ocorrer, será a muito longo
prazo.
Quando se optou pela divisão do BES em “banco bom” e “banco mau”,
solução geralmente considerada adequada, pensei, com “os meus botões”, que o
que estava em causa era a identidade dos titulares dos ativos e não a qualidade
dos mesmos. Hoje, esta ideia, face ao que se vai conhecendo, ganhou
consistência, senão vejamos:
O banco acumula prejuízos sistemáticos e com isso garante a injeção de
capital do Fundo de Resolução financiado pelo Governo. Pergunto-me se a gerência
do banco se destina a viabilizá-lo ou a garantir a efetivação do financiamento
público, gerando défices sucessivos. Estou tentado a pensar que sim. Por outro
lado, têm vindo a público vários casos de alienação de ativos em condições
deploráveis. Noticiam-se perdas da ordem dos 90 % dos valores contratualizados,
havendo indícios de que alguns ativos foram recomprados, a preço de saldo, por
sócios ou amigos dos titulares das respetiva imparidades! Lamentável! Acresce,
para cúmulo, que a Lone Star, segundo
consta, se prepara para vender o Novo Banco, já saneado financeiramente, com
ganhos substanciais! A ser verdade, é vergonhoso e deveria conduzir à severa
punição dos responsáveis por tal desastre.
Será o cidadão eleitor, que será fiscalmente penalizado, tão distraído
que ainda irá premiar eleitoralmente os responsáveis por esta catástrofe? Eu
não!
Peniche, 15 de Maio de 2021
António Barreto
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