O 25 de Abril Visto
da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José
António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em
vésperas as primeiras eleições presidenciais
….Será curioso observar, a
propósito, o que se passa durante a guerra civil de 1832-1834, quando a
burguesia portuguesa, desempregada depois da independência do Brasil, se põe a
reboque das forças liberais - de um exército de políticos, exilados – não para
fazer prevalecer na sociedade portuguesa a sua ordem, a ordem burguesa, mas
para desapossar o clero e a nobreza das suas terras e para se meter depois, ela
própria, nas terras do clero e da nobreza, conservando praticamente intactos os
privilégios que antes essas duas classes usufruíam, prolongando a sociedade feudal. ....(JAS)
…..gostaria de recordar o que me
disse um dia um reconhecido historiador: que Salazar tinha deixado o Portugal
em condições ótimas para o estabelecimento de um “regime socialista” ( e
socialista, neste caso, entre aspas, evidentemente). …(JAS)
….Aí tu tocas num aspeto muito
importante: Portugal é um país onde nunca se verifica um livre jogo de forças,
onde tudo se resolve através de leis, de decretos. … (JAS)
…Apenas um setor se mantém
aparentemente invulnerável ao regresso ao salazarismo: o Ensino. …(VJS)
…A burguesia em Portugal,
satisfaz-se com a pilhagem colonial – e com o seu negócio. Não se forma em
Portugal uma burguesia industrial. .. (JAS)
….Não se coloniza o Império –
conserva-se o Império. Não se exploram os recursos do Império – mantém-se o
Império. O Império é “terra sagrada”, é Pátria - e como tal, inalienável. …Com
Portugal passa-se exatamente o contrário: a possibilidade do regime e do
Império sobreviverem reside em não desenvolver, em paralisar.”… (JAS)
Aqui, JAS revela surpreendente ignorância; na sequência da 1ª GM,
Portugal ficou obrigado pela comunidade internacional a intensificar o
desenvolvimento das suas colónias. A partir do início dos anos sessenta – em
particular no consulado marcelista e em colaboração com a CEE - e até ao 25/04/74,
o crescimento económico - agrícola e pescas, industrial - bebidas, minérios,
petróleo - e comercial, com o acesso direto a financiamento europeu e americano
- sobretudo de Angola e de Moçambique, foi simplesmente espantoso,
impressionante - os dados estão acessíveis -, e esta, sim, terá sido, quanto a
mim, a principal causa do empenho internacional no movimento independentista,
suportado politicamente pelo reconhecimento do “direito dos povos à
autodeterminação”, na sequência dos acordos pós-guerra - 2ª GM. (nota AB).
“…Não é por acaso que setores
oposicionistas identificados hoje com o Partido Socialista acorrem a apoiar
vivamente as teses neocolonialistas, ditas “federalistas”, que Spínola começa a
defender quando era ainda governador da Guiné. …(VJS)
….Uma das teclas em que bate
constantemente a propaganda da República é a da incapacidade do aparelho
monárquico para garantir a integridade nacional, para manter as colónias –
donde a necessidade imperiosa de o derrubar. Ora não deixa de ser curioso
estabelecer um paralelo entre uma primeira República que surge no palco do país
a defender Portugal da perda à vista das colónias e uma segunda República que,
precisamente ao contrário, aparece a afirmar a necessidade de Portugal oferecer
às colónias a possibilidade de se autodeterminarem. ….(JAS)
Mudança, afinal, consequência da nova ordem mundial, adotada no pós 2ª
GM e bandeira do PCP e, mais tarde, de Mário Soares e do Partido Socialista.
(nota AB)
Peniche, 22 de Outubro de 2018
Antonio J.R. Barreto
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